Setembro traz quase sempre consigo sentimentos de nostalgia e melancolia causados pelo fim do verão e tudo o que este representa (férias, sol, calor, passeios) e temos, portanto, a sugestão perfeita para acompanhar este estado de espírito e o regresso das temperaturas amenas, Conversations with Friends.
Para ser vista em dias de pouca energia, embrulhados numa manta no sofá, Conversations With Friends é um drama romântico de 12 episódios baseado no livro, com o mesmo nome, escrito por Sally Rooney, autora do sucesso internacional Normal People. As duas séries partilham parte da equipa criativa, incluindo o realizador Lenny Abrahamson e a guionista Alice Birch. Conversations With Friends também é uma produção irlandesa do estúdio Element Pictures para a BBC Three e a Hulu, estando disponível em Portugal através da HBO Max.
Alison Oliver (Frances), Sasha Lane (Bobbi), Joe Alwyn (Nick) e Jemima Kirke (Melissa) protagonizam o enredo intimista, introspetivo e incrivelmente humano desta série irlandesa. Ao longo da narrativa que abrange o fim do verão e os meses frios do final do ano, as quatro personagens envolvem-se numa rede romântica complicada e várias vezes questionável, ainda que nunca de resposta simples.
Em Conversations With Friends, Sally Rooney privilegia emoções complexas que se debatem numa luta entre o correto e o prazeroso, criando personagens que são quase tão difíceis de gostar como são difíceis de rejeitar.
A protagonista, Frances, recebe a porção principal do screen time enquanto navega as relações amorosas, platónicas e familiares da sua vida. Enquanto estudante universitária, a sua história funciona também como um coming of age em que Frances, através dos seus erros e deslizes, ganha independência de espírito e constrói a sua personalidade. É a típica protagonista moldável e, muitas vezes, apática, que vai ganhando forma definitiva ao longo dos episódios. Apesar de imperfeita e frustrante, vê-la crescer acaba por criar no espectador empatia e uma vontade de a ver triunfar.
O elenco de apoio é igualmente ambíguo. Nos primeiros episódios, Nick aparenta ser o interesse amoroso galã, um inglês sofisticado e moderno, com uma aparência cuidada e um amor pela arte, mas ao mesmo tempo que se descobre o lado submisso da sua personalidade, são revelados também detalhes sobre o seu passado que conferem à personagem uma profundidade que faz pensar. Já com Bobbi, o estereótipo da jovem boémia reacionária também é rapidamente subvertido através da sua complicada relação com Frances e de momentos em que o seu exterior desafetado cai e revela alguém bem mais vulnerável.
Conversations With Friends brinca um pouco com os estereótipos e clichés das novelas românticas ao abordar temas como a infidelidade, a paixão arrebatadora ou o amor de infância, mas consegue desconstruí-los de forma subtil e bem integrada. Ao fazê-lo, apresenta novas perspetivas sobre o que é ou não correto e permitido dentro do amor romântico.
Uma das principais ideias exploradas na série é o contraste entre a monogamia e a poligamia – em que pontos estas duas filosofias se encontram, se há áreas cinzentas de dúvida e se é possível uma pessoa caminhar nessa linha que as separa.
A abordagem à sexualidade – e por associação à orientação sexual – das personagens é de igual forma uma lufada de ar fresco pela sua nuance. Bobbi, Frances e Melissa são todas mulheres que se sentem atraídas por outras mulheres e que falam sobre esse facto abertamente, sem que nunca as questões queer da narrativa se tornem de qualquer forma diferentes das restantes dinâmicas românticas. Por a sua atração por pessoas do mesmo sexo ser apenas mais uma das suas características, entre muitas outras, e não o centro da sua existência, estas personagens conferem uma representação da experiência LGBTQ+ mais terra a terra e real.
Ainda que com os seus defeitos e com um ritmo que pode desafiar a capacidade de atenção da geração TikTok, o que torna Conversations With Friends uma série que merece o tempo investido por quem a vê é, por um lado, as questões que levanta sobre as relações românticas e, por outro, a acessibilidade das personagens, assente nas suas imperfeições, que são, no final de contas, recebidas pela história com uma empatia reconfortante. Um abraço acolhedor para os meses cinzentos que se avizinham.