Já há muito tempo, escrevi uma crónica sobre personagens que mereciam mais tempo de ecrã. Desta vez, quero ir mais além nessa questão e divagar um pouco sobre as séries que não aproveitaram bem o potencial dos seus personagens. Tal não se prende necessariamente com o pouco destaque que se dá a uma personagem, até porque tenho aqui uma principal a quem não faltou tempo de ecrã, tem também a ver com as suas histórias, com o seu potencial e com a própria história da série em questão. Escolhi então sete personagens – todas elas mulheres, por coincidência – que poderiam ter dado muito mais às suas séries e a nós, espectadores.
A Skye de 13 Reasons Why é, para mim, uma das personagens cujo potencial foi mais desaproveitado e, por consequência, o de Clay. No entanto, é de Skye que quero falar. Não quero de forma nenhuma dizer que ela é uma espécie de Hannah, mas a verdade é que as duas têm algumas coisas importantes em comum: raparigas que se sentiam sozinhas, que achavam que não tinham ninguém com quem podiam realmente contar, para quem o peso do mundo se tornou insustentável de uma forma que as levou a fazerem mal a elas mesmas. Hannah matou-se, cortando os pulsos, e Skye mutilava-se. Hannah representou o lugar mais negro onde alguém pode estar e Skye devia ter representado, em oposição, a rapariga a quem a escola, os colegas, o rapaz de quem gostava, as pessoas no geral, não deixaram ficar mal. Clay aproximou-se dela, sabia que Skye estava num estado frágil e mesmo assim brincou com os sentimentos dela, sabendo perfeitamente que ainda estava apaixonado por Hannah. Skye era uma miúda querida que não permitiu que muitas pessoas vissem quem ela verdadeiramente era, mas também ninguém se deu a esse trabalho. Skye devia ter simbolizado a esperança. Podia ter representado perfeitamente uma forma de expiação para aqueles que estavam à sua volta e que não tinham sido capazes de fazer nada por Hannah, mas que podiam fazer as coisas de forma diferente agora. Não aconteceu nada disto e Skye foi completamente descartada enquanto personagem durante a 2.ª temporada. Bem, e a verdade é que qualquer tipo de enredo teria sido melhor do que aquele julgamento!
De 13 Reasons Why vou passar para outra série bem popular entre o público: Once Upon a Time. Popular até certo ponto, porque acho que a maioria de nós está de acordo que aquela última temporada foi um completo desastre e mais valia que nunca tivesse acontecido. No entanto, essa péssima temporada teve um ponto muito positivo: Ivy Belfrey, ou Drizella, como lhe queiram chamar. De toda a panóplia de personagens novas, e eram muitas, Ivy foi a única que, basicamente, não me irritou profundamente e também a única que teve uma boa interpretação. Aplausos para Adelaide Kane! Mais do que apenas uma personagem que não me deu cabo da paciência, ela foi a luz de toda a temporada. Nem a nova versão de Regina chegou sequer aos calcanhares da que conhecíamos até então! Fiz uma espécie de reset na minha mente – o que não é difícil, já que a minha memória não é das melhores – em relação a todo o enredo da 7.ª temporada da série e nunca estive muito familiarizada com as histórias de contos de fadas, mas Ivy ajudou a salvar uma história que, de outra forma, teria sido muito pior. A personagem não é nenhum anjinho, mas também não é uma vilã, é alguém com quem acho que não é difícil a audiência identificar-se e a sua história familiar pouco feliz contribuiu para dar camadas à personagem, na linha do que já tinha sido feito com Regina e Zelena, de certa forma. O Henry adulto, Victoria, Jacinda, Lucy, Alice, Mother Gothel foram todos personagens que pareceram sempre forçados, como um gigante erro de casting, e Ivy era natural, parecia uma pessoa real. Sempre que ela estava no ecrã era um alívio, mas preferiram reciclar a história, colocando a filha de Henry como a nova “truest believer” e dar tempo de ecrã à horrível Victoria Belfrey/Rapunzel de Gabrielle Anwar.
De uma série que durou tempo demais, vamos partir para mais uma: Grey’s Anatomy. Expressarei o meu descontentamento pela longa duração do drama médico até que finalmente decidam dar-lhe o golpe de misericórdia ou até melhorarem imensamente o nível de qualidade. No entanto, já não tenho esperança em relação a esta segunda hipótese. Uma coisa de que também já me queixei imensas vezes é da enorme quantidade de personagens que a série tem. Até os mais desinteressantes têm direito a uma história ou a um romance e o foco perde-se. No entanto, se querem realmente dar destaque a todos os personagens e mais alguns, porque é que não apostam nos que têm potencial? Temos que levar com os internos (que já são o terceiro ou o quarto grupo, haja paciência!), mas há especialidades que parecem que deixaram de existir. Enquanto Addison esteve na série, tivemos sempre presente uma cirurgiã na área da Obstetrícia e da Ginecologia, mas depois disso nada e já lá vai imenso tempo. Carina é uma mulher forte, inteligente, divertida e que, inclusive, já trabalhou nalguns casos interessantes, mas foi completamente relegada para segundo (ou pior) plano. E a verdade é que quando aparece faz coisas positivas pela série. Trocava com toda a vontade o tempo de ecrã da maioria dos personagens para poder ver mais de Carina. No episódio em que Andrew morreu tivemos direito a ver um bocadinho dela, algo que muito me agradou, mas no episódio seguinte quase que já não voltou a aparecer. Não vejo Station 19 e sei que tem bastante mais destaque lá, mas isso não me consola, porque em Grey’s Anatomy fazem falta personagens como ela.
Apesar de Homeland ser outra série com uma mulher como protagonista e ter mais umas quantas personagens femininas interessantes, podia ter apostado mais fortemente nesta questão do girl power. E quando penso nesta série e em girl power, Astrid vem-me imediatamente à mente, mesmo só tendo aparecido numa dúzia de episódios. O problema é que a morte de Astrid não foi nada satisfatória! Quer dizer, ela passou a carreira a trabalhar para o BND (o Serviço Federal de Inteligência alemão) e sobreviveu para depois basicamente morrer a ajudar Quinn num momento difícil e sem sequer poder fazer nada. Astrid merecia melhor do que isso! Merecia ao menos ter tido uma hipótese de se salvar e de dar luta, mas aquela arma descarregada ditou o fim da personagem.
Bem viva está a Lulu de Pose, mas também queria muito mais para ela. Blanca, Angel e Elektra acabam por ter a honra de protagonistas e apesar de gostar imenso das primeiras duas, de achar Elektra um máximo e admitir sem qualquer margem para dúvida que as três já tiveram arcos de história imensamente interessantes que deram muito à série, sinto que Lulu está longe de ter o mesmo destaque e a verdade é que ela tem muito a oferecer. Lulu é divertida, leal, inteligente, corajosa, uma boa amiga e tem um coração generoso. Ainda por cima, sabe arrasar nos ballrooms e tem um certo toque de sassy discreto que me agrada. Espero que a 3.ª e última temporada da série seja a que permite que Lulu brilhe verdadeiramente. Já falta pouco para descobrirmos!
Quase a terminar, trago a Carol e a Susan de Friends, que a determinada altura nunca mais foram vistas. É claro que esta comédia é épica e funcionaria perfeitamente bem só com os seis protagonistas, mas, de todos os personagens secundários, acho que Carol e Susan eram, sem dúvida, aquelas que podiam trazer mais à série. Primeiro, o facto de Ross ter visto o seu casamento terminar porque a mulher gostava, também ela, de mulheres, era uma piada que nunca cansava. Depois, as picardias entre Ross e Susan eram épicas e tenho que admitir que me dava uma satisfação especial sempre que Susan levava a melhor, o que acontecia na maior parte das vezes. Aliás, toda a dinâmica Ross/Carol/Susan era imensamente engraçada na sua awkwardness. Tão importante quanto tudo isto, é o facto de, na altura, os casais não heterossexuais serem pérolas raras na televisão e Carol e Susan foram uma espécie de marco. Teria sido muito giro, à medida que o mundo se tornava mais aberto, ver um pouco mais da relação das duas.
Finalizo num registo um bocadinho diferente, com a Edith de Downton Abbey. A personagem teve muito tempo de ecrã, inclusive, nas temporadas mais avançadas da série, revelou-se uma mulher à frente do seu tempo e independente, mas o seu frequente azar em termos de relações amorosas e na vida em geral, bem como a relação extremamente desagradável que tinha com a irmã mais velha, Mary, só contribuíram para fazer de Edith uma espécie de “coitadinha”. Edith esteve sempre um pouco na sombra das irmãs e acho que todos nós, fãs da série, tínhamos essa noção, à qual a personagem também não se encontrava alheia. Até aos olhos dos pais era assim. Edith pode ter acabado por ter um final feliz, mas o seu percurso foi tão azarado que acho que dificilmente será possível descolá-la dessa imagem, o que é uma pena, porque esta é a mulher que, em plenos anos 20 do século passado, quis aprender a conduzir, se dedicou a uma profissão e cometeu aquilo que na época era uma enorme ousadia: ficar com uma criança nascida fora do casamento. Edith merecia mais histórias que a tivessem mostrado como uma mulher forte e não a “mosca morta” que nos tentaram impingir e que ela não era de facto. Michelle Dockery, e a sua Mary, era a estrela da série e isso ofuscou o brilho de Edith.
Quais são aqueles personagens que achas que tinham imenso para dar, mas cujo potencial foi desperdiçado?