Como o Dia da Mulher se celebra amanhã, não podíamos deixar passar a data sem homenagear algumas das mulheres extraordinárias que conhecemos das séries. Já há algum tempo, também em comemoração da data, demos destaque às mulheres mais badass das séries e desta vez temos mais um conjunto de mulheres, algumas incrivelmente destemidas e corajosas, outras com um coração enorme que tornam o mundo um lugar melhor só por fazerem parte dele.
Amanita Caplan [Sense8]: O amor pode ser uma força poderosa e no caso de Amanita isso não podia ser mais verdade. A maioria das pessoas mostrar-se-ia cética à existência de uma cluster em que os membros conseguem falar uns com os outros telepaticamente e têm à disposição as habilidades dos restantes para ultrapassar quaisquer dificuldades que se lhes apresente pela frente. A maioria inclinar-se-ia para a possibilidade de a outra pessoa precisar de ser internada na ala psiquiátrica de um hospital, mas Amanita nunca duvidou de Nomi e fez sempre tudo o que estava ao seu alcance para a proteger. Aliás, para proteger toda a cluster! A vida de Nomi é uma verdadeira montanha-russa, mas Amanita nunca deixou de estar ao lado dela e dedicou-lhe todo o amor que tinha faltado na vida da namorada até a conhecer. Amanita é uma mulher incrivelmente generosa que nunca desiste de lutar por aqueles que ama e naquilo em que acredita.
Marcia Clark [American Crime Story: The People v. O.J. Simpson]: Eu era uma criança pequena quando o verdadeiro julgamento de O. J. Simpson teve lugar, portanto qualquer imagem que tenha acerca de Marcia Clark vem da série e não da realidade. E podem crer que não podia ser uma imagem mais positiva. É justo dizer que, durante todo o julgamento, ela foi humilhada pela comunicação social e também pelos advogados de defesa do caso. Porquê? Simplesmente porque eles podiam fazê-lo. A única razão (estúpida, mas não propriamente surpreendente) para isso é o facto de Marcia ser mulher. Portanto vamos ignorar a sua inteligência, a sua força e integridade num julgamento que foi uma anedota e vamos antes concentrar-nos no facto de que as suas roupas ou o seu cabelo são um insulto à moda. Infantil, certo? O tipo de material em que os miúdos pegam para se arreliarem uns aos outros, mas não algo que devesse vir de supostos profissionais que estão a lidar com aquele que é considerado o julgamento do século. Esta mulher aguentou tanta coisa durante aquele julgamento e, mesmo assim, nunca desistiu e nunca abandonou a sua estratégia de fazer jogo limpo quando podia ter feito perfeitamente como os colegas de profissão da acusação e ter ajudado a fazer daquela sala de tribunal um verdadeiro circo mediático pelas piores razões.
Lana Winters [American Horror Story: Asylum]: Mais uma mulher de fibra interpretada por Sarah Paulson! Quando penso em grandes mulheres das séries, Lana é, inevitavelmente, uma das primeiras personagens que me vem à cabeça. Provavelmente a primeira de todas. Vamos lá recordar as coisas que ela teve de enfrentar. Internamento involuntário numa instituição? Check! Humilhação pessoal? Check! Violência física, emocional e sexual? Check, check, check! Isto teria sido mais do que suficiente para destruir a maioria das pessoas, mas Lana sobreviveu e saiu deste asilo pronta a denunciar tudo o que se passava dentro daquelas portas.
Irmã Julienne [Call the Midwife]: Podia fazer uma crónica só com as mulheres de Call the Midwife, mas optei por escolher esta personagem que se tem destacado ao longo da série devido à sua personalidade compreensiva, justa, ponderada e generosa. As freiras são muitas vezes retratadas como severas na ficção, mas a Irmã Julienne não podia ser uma pessoa mais tolerante nem ter uma maior capacidade de lidar com a diferença. Ela é a pessoa de maior autoridade na Nonnatus House, mas é vista por todas as outras freiras, bem como pelas enfermeiras, como alguém a quem se pode recorrer em todos os momentos. Para além de ser uma parteira e uma enfermeira muito competente que consegue estabelecer uma ligação com as suas pacientes, a Irmã Julienne é uma excelente conselheira e mentora, alguém que tem sempre uma palavra amiga e nunca julga ninguém. Quando Shelagh começa a ter dúvidas em relação à vida religiosa, a Irmã Julienne nunca a tentou demover, nunca a fez crer que era algo que passaria com o tempo. Ao invés, apoiou-a sempre e fez Shelagh entender que esta seria sempre importante para todas elas. Mais recentemente, na 8.ª temporada, lidou-se muito com o tema do aborto, mas o primeiro episódio, em especial, foi devastador. Mais uma vez, esta personagem provou que, seja qual for a situação, ela fará sempre o melhor pelas pacientes ao seu cuidado, com a maior humanidade possível. Estamos a falar de uma série passada nos anos 50/60 e se o aborto continua a ser um tema polémico e altamente recriminado pela Igreja, na altura era ilegal, mas a Irmã Julienne tem um coração de ouro e acredita que todas as pessoas que precisam de ajuda – quer se trate de cuidados médicos ou de outros – a merecem ter, sejam quais forem as circunstâncias.
Tyra Collette [Friday Night Lights]: Talvez Tyra pudesse ter tido uma vida bem diferente se não tivesse crescido numa família tão instável. A adolescente sempre teve o desejo de sair de Dillon, mas até Tami surgir na sua vida nunca pareceu preocupar-se muito com os estudos ou a preparação do futuro. Apesar de ter uma mãe carinhosa, a verdade é que Tyra acabava muitas vezes por assumir o papel de figura responsável em casa em vez do de filha. É especialmente memorável o momento em que Tyra expulsa o namorado agressivo da mãe e a obriga a escolher entre ela ou ele, sabendo que será a única maneira de Angela se livrar definitivamente daquela relação tóxica. Com a mãe desempregada e sem poder prover ao sustento da casa, Tyra faz o possível por lhe arranjar um emprego, mas também isso não corre muito bem, visto que a progenitora acaba por se envolver num caso amoroso com o seu patrão casado. Angela é ainda dada a momentos de depressão em que se entrega a comportamentos desaconselháveis e Tyra não se ressente da mãe, assumindo mais uma vez o papel de cuidadora. O mundo seria um lugar melhor se os miúdos pudessem ser simplesmente miúdos, mas nem sempre é possível e Tyra mostrou-se sempre à altura.
Tasha ‘Taystee’ Jefferson [Orange Is the New Black]: Tal como Tyra, também Taystee poderia ter tido melhor sorte na vida se tivesse crescido no seio de uma família normal que lhe tivesse proporcionado as oportunidades que nunca teve e onde estaria afastada de certas más influências a que foi sujeita enquanto esteve no sistema de acolhimento. Engraçada, dotada de uma grande inteligência, de uma capacidade de adaptação e de sobrevivência às agruras da vida e com um sentido apurado de justiça e do bem, Taystee deveria ter sido qualquer coisa que quisesse. No entanto, a vida nunca lhe sorriu e Taystee teve sempre dificuldade em adaptar-se à vida lá fora, quer em termos do sistema de acolhimento ou da prisão. Atrás das grades, ela foi uma reclusa notável que se deixou envolver nas atividades prisionais, que mostrou o seu valor enquanto assistente de Caputo, que lutou pelas amigas e que, dentro do pior cenário possível, arranja sempre uma forma de tornar a vida dos que estão à sua volta melhor. Taystee encontrou nisso um propósito para a sua existência, uma forma de se salvar a ela mesma. Esta jovem mulher é a prova de que o sistema falha enormemente com aqueles que tem ao seu cuidado.
Rene Carpenter, Marge Slayton e Trudy Cooper [The Astronaut Wives Club]: São sete as mulheres de astronautas retratadas nesta série, mas três delas demarcam-se das restantes pelos seus papéis enquanto mulheres em finais dos anos 50 e na década seguinte. Rene tem formação universitária, é uma mulher confiante que sempre fez uso da sua voz para lutar por aquilo em que acredita, tendo inclusive sido politicamente ativa, e que vai atrás de uma carreira que lhe permita escrever sobre questões importantes, embora se depare com vários obstáculos numa altura em que se acreditava que o papel da mulher era, essencialmente, o de dona de casa. Além do mais, Rene decidiu fazer uma vida separada do marido quando as coisas entre os dois deixam de funcionar. Algo que seria considerado um pouco (talvez mais próximo do muito) escandaloso para a altura, mas nada que se compare com o caso de Marge Slayton, que já tinha sido casada anteriormente. Marge não se envergonhava disso, embora também não o andasse a espalhar aos quatro ventos, como considero sensato, e não correspondia em muito ao protótipo de mulher daqueles tempos. A sua personalidade é irreverente, astuta, engraçada, mas também generosa e Marge é o tipo de mulher que apoia sempre as outras quando se trata de fazerem o que está certo e lutarem por elas mesmas. Trudy é outra verdadeira feminista. Ainda antes do marido, já ela tinha brevet de piloto. Depois de descobrir que Gordo a traía, Trudy deixou-o, mas quando este foi selecionado para a NASA era requerido que fosse casado e então ela aceitou que fizessem de conta que o seu casamento era perfeito, pois achava que ele merecia aquela oportunidade de carreira, mas sob os termos dela. Trudy é uma verdadeira defensora dos direitos das mulheres e é épico o momento em que menciona que os porcos hão-de voar no espaço primeiro do que uma mulher. Consigo lembrar-me de uma analogia melhor: já chegou o dia em que certos jumentos chegaram à presidência sem que mulher alguma tivesse ocupado o cargo.
June Osborne [The Handmaid’s Tale]: June tornou-se o verdadeiro símbolo da luta contra o regime totalitário teocrático e patriarcal de Gilead. Ao longo da série fomos podendo vê-la a ter pequenos atos de revolta que cresceram para grandes ações – crimes para os fascistas – contra o regime, mas a verdadeira revolução chegou na 3.ª temporada. Uma das grandes batalhas pessoais de June estava ganha, com a sua bebé em verdadeira segurança no Canadá depois de Fred e Serena terem sido detidos pelos seus crimes, mas a handmaid é uma verdadeira mulher de armas que escolheu uma batalha maior: tirar o maior número possível de crianças de Gilead e fazê-las chegar ao Canadá, onde poderão ser livres. Recuso-me a acreditar que June vá morrer depois de ter feito algo tão heroico, mas mesmo que assim seja morre em detrimento de um bem maior, para que aquelas meninas nunca tenham de ser obrigadas a viver o que ela viveu. No entanto, o heroísmo de June vai para além das crianças que salvou. Ao recrutar tantas outras mulheres para a ajudarem naquela jornada, ela criou um verdadeiro exército de apoiantes na luta contra o poder. É quando as pessoas acordam e estão dispostas a lutar pelo que está certo que as ditaduras caem!
Karen Duvall e Grace Rasmussen [Unbelievable]: Estas mulheres são a prova de que uma investigação policial vai muito para além do fator provas. São importantíssimas (nenhum país é uma democracia se condenar alguém sem provas de que foi cometido um crime), mas não são tudo. Principalmente quando estão em causa violações, crimes em que há sobreviventes para contar o que aconteceu. Não sei se, por serem mulheres e por pertencerem a uma geração mais aberta, Karen e Grace são mais sensíveis a este tipo de crime ou se são simplesmente excelentes polícias e pessoas mais empáticas, mas a verdade é que a forma como lidaram com a investigação foi infinitamente melhor do que a dos detetives homens que descredibilizaram Maria quase desde o primeiro minuto. Quem passa por um evento traumático está apenas a tentar sobreviver a isso, não está a registar todos os momentos que o antecederam, muito menos o durante e o depois. Suponho que seja normal haver inconsistências. Eu não me lembro de quantos copos de sumo bebi ao almoço, portanto… As duas detetives trataram as vítimas com respeito e decência e fizeram aquilo em que consiste verdadeiramente o seu trabalho: investigaram. Deram tudo delas, descobriram mais vítimas e levaram o culpado à justiça.
Nancy Campbell [World On Fire]: Nancy é uma jornalista americana que poderia estar confortavelmente instalada e segura no seu país a denunciar à distância as atrocidades nazis, mas encontra-se na Europa a acompanhar bem mais de perto o desenrolar dos acontecimentos no fatídico ano de 1939, que marcou o início da mais sangrenta guerra da História da deshumanidade. É certo que a influência dos Estados Unidos como um país muito poderoso podiam dar a Nancy uma certa segurança que os seus colegas de profissão europeus provavelmente não teriam, até porque os E.U.A. ainda estavam muito longe de entrar na guerra, mas o facto de ser americana não a protegeria de bombardeamentos nem da crueldade nazi. Nancy ultrapassou muito os limites daquilo que a maioria dos jornalistas teria sido capaz de noticiar. Estou certa de que ela teve medo, de que estava longe de ser alheia aos perigos em que incorria ao falar sobre certas coisas e ao pressionar determinadas pessoas, mas acho que ela achou que era seu dever e um serviço ao verdadeiro jornalismo denunciar aquilo que estava realmente a acontecer em vez de andar a contar meias verdades (ou completas mentiras). Mais do que fazer o que a sua profissão lhe competia, ela mostrou também uma humanidade incrível para com uma família alemã sua vizinha que não apoiava Hitler e que, ainda para mais, tinha uma criança com epilepsia. O destino dessas crianças era a institucionalização, a esterilização e a morte. Nancy fez os possíveis para proteger essa família, mas consciente do inevitável, Claudia, a mãe da menina, acabou com a sua própria vida e a da filha.
Diana Sampaio