A 4.ª temporada de The Boys, da Prime Video, é sem dúvida a mais inconstante até agora. Embora tenha apresentado alguns episódios ao nível a que estávamos habituados, também incluiu alguns dos mais fracos da série. A diferença principal está nos momentos surpreendentes: antes eram sempre certeiros, mas agora alguns ficaram aquém. No entanto, quando resultaram, foram verdadeiramente impressionantes.
A temporada começou de forma morna. Os primeiros três episódios pareciam desconectados, sem a energia habitual. O sentimento de perigo, tão presente nas primeiras temporadas, estava ausente. Os protagonistas começaram a agir de forma cada vez mais descarada, sem consequências, o que retirou a tensão e o medo de serem descobertos, algo que fazia parte do charme da série.
Os enredos também pareceram um pouco desconexos. A súbita separação entre Frenchie (Tomer Capone) e Kimiko (Karen Fukuhara) foi mal desenvolvida. Depois de temporadas a explorar a sua relação, a decisão de afastá-los pareceu apressada e pouco trabalhada, obviamente que precisava de um abanão para não se tornar repetitiva, mas podiam ter encontrado outra forma mais coerente para com a trama. O drama em torno do pai de Hughie (Jack Quaid) também foi forçado, sem o impacto emocional esperado. Nesta fase da série, os personagens principais já estão bem estabelecidos, espera-se mais ação e menos camadas de drama desnecessário. Hughie, aliás, leva o prémio de mais sofredor desta temporada.
Por outro lado, os novos personagens foram uma lufada de ar fresco. Firecracker (Valorie Curry) destacou-se pela sátira que representa: uma personagem sem noção, mas extremamente divertida para quem está a ver de fora. Sage (Susan Heyward) foi uma incógnita fascinante, deixando sempre a dúvida se era realmente inteligente ou apenas rápida a reagir, exceção feita com as suas interações com The Deep (Chace Crawford). Até Homelander (Antony Starr) se questionava sobre ela, tornando-a ainda mais intrigante. As paródias de personagens como Batman, Spider-Man e Mystique foram muito bem inseridas, proporcionando momentos alucinantes e engraçados com Tek Knight (Derek Wilson) e Webweaver (Dan Mousseau). Com Shapeshifter usaram uma cartada brilhante, o modo como foi usada a personagem foi bastante criativo e fez todo o sentido na narrativa. Estas deturpações funcionaram como um comentário perspicaz sobre os arquétipos de super-heróis, demonstrando que os criadores ainda têm o toque de Midas. A nova fase de Noir (Nathan Mitchell) também trouxe uma abordagem divertida e renovada ao personagem.
Todo o enredo de Butcher (Karl Urban) foi, para mim, o ponto mais baixo da temporada. Foram oito episódios a girar em torno da questão do vírus, que, no final, não teve qualquer impacto significativo. Apesar dos episódios de Gen V terem também contribuído para a construção deste enredo, o único twist interessante foi o que envolveu a personagem interpretada por Jeffrey Dean Morgan. No entanto, mesmo esse também acabou por ter poucas consequências práticas, para já. O último episódio foi um pouco anti climático. Encerraram-se algumas narrativas, mas fiquei mais satisfeito com a perspetiva do que poderá vir na 5.ª e última temporada, do que propriamente com esta temporada como um todo.
Apesar das inconsistências, The Boys mantém a sua crítica social mordaz e perspicaz. Através de personagens bem construídos e situações incisivas, a série continua a elevar-se acima de muitas outras produções televisivas. Mesmo numa temporada menos consistente, os momentos de sátira e a crítica social apurada garantem que a série permaneça uma força única e inovadora no panorama televisivo. Em suma, a 4.ª temporada de The Boys pode ter tido os seus altos e baixos, mas continua a desafiar normas e expectativas. Apesar dos tropeços, os momentos bem-sucedidos e as críticas sociais afiadas garantem que a série permaneça relevante e envolvente.
Todos os episódios da 4.ª temporada de The Boys já se encontram disponíveis na Prime Video.
Melhor episódio:
Episódio 7 – The Insider – Fiquei muito indeciso entre dois episódios. O 6 porque tem um dos melhores momentos, pelos quais The Boys ficou famosa e conhecida, toda a dinâmica na festa da mansão (e da cave…) foi muito engraçada, mas este episódio 7 tem a melhor sequência de luta da temporada e, bom, The Boys é muita coisa, mas não deixa de ser uma série sobre super-heróis e vê-los em ação com esta qualidade é sempre de louvar.
Personagem de destaque:
The Deep (Chance Crawford) – Mais uma vez fiquei indeciso entre dois personagens. Ashley (Colby Minifie), porque é das poucas personagens humanas que consegue navegar no mundo dos Supes e sobreviver. Embora tenha comportamentos questionáveis, também ajudou muitas vezes e é uma personagem com camadas que foi muito bem aprofundada esta temporada, sem falar na sua cena final… No entanto, exatamente pela questão do aprofundamento, mas no sentido oposto, surge The Deep, que esta temporada finalmente se revelou. Nas temporadas anteriores, era representado apenas como um ser básico, extremamente supérfluo e sem nada a acrescentar. Nesta leva de episódios, achei-o diferente; a relação dele com o polvo Ambrosious (com a voz da fantástica Tilda Swinton) deu-nos alguma perspetiva. Finalmente, escolheu o seu lado e agiu de acordo com isso. A sequência de luta em que participou foi espetacular e surpreendente, pois mostrou ainda outro lado que também não tínhamos visto antes. Sempre o subestimamos, mas ele, afinal, apresenta-se como uma força a ser reconhecida. No entanto, não perdeu a essência e as suas interações continuam a ser extremamente engraçadas dentro da sua limitada mente, bro.