5Starz – Review da Minissérie
| 30 Dez, 2021

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Minissérie

Episódios: 6

[Contém spoilers]

Advertência: este artigo contém menções de violação, droga e posse de armas.

A juntar à série Barman, 5Starz é uma das grandes novidades do RTP Lab deste mês de dezembro. Estreada a dia 20 na RTP Play, conta-nos a história de cinco estafetas que trabalham para a empresa 5Starz e leva-nos pelo dia a dia de cada um destes jovens adultos problemáticos e traumatizados que lutam pelo seu espaço no mundo e pela sua identidade. Cinco episódios, dedicados a cada uma das personagens principais, e um último que encerra os seus capítulos.

A criação é de Justin Amorim, e o elenco é uma mescla de atores e youtubers-atores dispostos a trazer à tona vários conceitos que rodeiam a nossa sociedade nos dias de hoje. Desde a pressão parental e o peso das expectativas, à transição de género, ao consumo abusivo e venda de droga, até à violação, todos estes temas são abordados em 5Starz de uma forma simples, crua e despida de qualquer tipo de filtro embelezador.

Se há algo a que esta série se propõe é precisamente isso: normalizar a conversa em tópicos sensíveis, que precisam de ser abordados em televisão sem grandes floreados. Se o faz da melhor forma em certas situações? Fica para o espectador julgar.

Diego, Maria, Vera, Penélope e Rodrigo são os intrépidos estafetas que protagonizam esta mini história onde se derrubam grupos de WhatsApp de partilha de conteúdo privado, se diz não à droga, se ultrapassam traumas de infância com a ajuda da paixão assolapada e se traumatiza espectadores com um episódio inteiro de ASMR de mastigação.

São seis episódios onde quebramos algumas barreiras no que concerne o conteúdo em Portugal: longe fica a beleza da filmagem que vimos n’A Espia, ou a complexidade de argumento que está presente na comédia Pôr do Sol. Mas 5Starz não se prende ao que normalmente traz sucesso a uma série. O seu objetivo é precisamente esse: o guião não é complexo, aliás, pode-se dizer que de quando em vez é um pouco cringe e muito à-lá Morangos com Açúcar, e não há uma grande preocupação com os espaços físicos onde acontece a ação. O foco desta série são as pessoas, as personagens e as suas relações consigo próprios e com os que os rodeiam.

A droga é um elemento muito presente, bem como o estereótipo de que os estafetas não ambicionam muito na vida, pelo trabalho que fazem. A primeira premissa a que a série se propõe quebrar é precisamente esta: a de que um trabalho defina as pessoas e as suas ambições de vida. Depois, a droga. É uma fonte de dinheiro, mas também um escape ou uma moleta. Retratada como parte integrante da vida destes jovens adultos, passa até, de certa forma, despercebido o impacto que este mundo tem em quem nele se insere – até ao último episódio, com o final entregue à personagem Penélope. No final de tudo, não é de todo um mundo de benfeitores e 5Starz reafirma-o.

O episódio dedicado a Maria, o segundo da série, aborda, de uma forma até respeitosa, a violação. Maria revela, sem revelar, que foi violada pelo avô e isso torna-a numa mulher de armas, que luta por si própria mas que ao mesmo tempo se veste de “rosinha” quase como que em busca da sua inocência – a que lhe foi roubada. No meio da sua ideia meio mirabolante de usar o seu emprego como estafeta para se prostituir e ganhar mais dinheiro, cruza-se com um polícia por quem se afeiçoa e percebe que o próprio está a investigar um grupo de oito mil pessoas no WhatsApp que partilha conteúdo que viola a privacidade de quem é partilhado. É Maria quem põe fim ao mal causado, quase como que justiça poética pelo que lhe foi feito, no seu modo femme fatale de arma em punho.

Vera é a representante transgénero da série e a sua história de vida foca-se na sua procura pela fama, mas, ao mesmo tempo, o medo do que essa fama lhe traz quando a sociedade não apoia a sua verdadeira identidade. Talvez tenha sido a história mais apagada da série, mas ao mesmo tempo a mais gritante: apesar de todos nós vivermos com o peso da identidade e da falácia da aparência, só pode ser mais complicado ainda quando nascemos no género que não é o nosso.

A falácia da aparência é muito presente no constante da série: como estafetas, todos eles são avaliados pela aplicação 5Starz e isso parece ditar a forma como se sentem. Afeta, acima de tudo, Rodrigo. Rodrigo – o conhecido youtuber Nurb – traz-nos uma personagem que vive com uma forma de complexo borderline e, como consequência, não se consegue conectar com pessoas. Conecta-se com a droga e vive dependente do seu rating da aplicação que decresce a cada entrega que faz, assim como a sua auto-estima. O final traz-lhe uma donzela em apuros que o ajuda a quebrar a roda, mas, para além deste momento, não avançamos. A vida de Rodrigo continuará fora dos seis episódios da série, mais conhecedor de si próprio.

Ainda não falámos sobre o pior episódio na história dos episódios de todas as séries: ASMR de mastigação. Penélope é surda e tem uma obsessão com ASMR, particularmente ASMR de mastigação. O episódio que lhe é dedicado é todo ele composto por momentos em que Penélope mastiga ao microfone, vê vídeos de pessoas a mastigar, mastiga ao ouvido do seu novo namorado, Filipe. E, caro Justin Amorim, mastiga o cérebro de uma célere espectadora que não suporta o barulho da mastigação. Uma coisa é certa: esta espectadora não mais se vai esquecer do episódio. Se esse era o objetivo, foi completamente concretizado. Mas nada irá apagar a sensação “arrepiantemente” horrorosa de estar trinta minutos (que se tiveram que transformar em uma hora, pela quantidade de pausas obrigatórias durante o episódio) a ouvir pessoas a mastigar.

Para ajudar à festa, o ASMR da mastigação foi estando presente em mais do que um episódio. Obrigado, 5Starz. Compensa a banda sonora que, bastante caricata, encaixa na perfeição na amálgama de momentos e acontecimentos que é a série.

Em conclusão, 5Starz tem o seu valor por se propor a quebrar tabus de conversa. É direcionada, sem dúvida, a um público jovem adulto que se possa rever nestas circunstâncias que avassalam os intrépidos estafetas mas, ao mesmo tempo, deve ser vista com um filtro de surrealismo. Pomos as armas, a prostituição ou a morte de Diego com uma flecha do cupido de lado e o que temos é uma ótima forma de começar a quebrar o gelo e trazer à nossa televisão portuguesa temas que devem ser abordados da forma mais honesta e despida possível. Se é a isto que 5Starz se propõe, consegue.

Infelizmente, fica um pouco aquém no seu fio condutor, que se perde algures entre a mixórdia de temáticas abordadas nos pequenos seis episódios. 5Starz sim, mas para esta review, se calhar ficamo-nos pelas 4.

Joana Henriques Pereira

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