Após ter ficado entusiasmado com o piloto de Foundation, a fasquia era bastante alta para o resto da 1.ª temporada. Terá a série acabado tão bem como começou, ou os pontos fracos ficaram mais exacerbados?
Na verdade, apresento-me perante vós desiludido com o restante da temporada. 30% devido às expectativas por mim criadas, 10% por achar que era melhor a temporada ter menos um ou dois episódios e 60% porque a série parece não saber o que quer fazer. Não quero com isto dizer que duvido que haja um plano, apenas que esse plano simplesmente não parece ser bom.
Foundation pressupõe-se, e até se vangloria, em contar uma história que ultrapassa o tempo e o espaço. O problema com isso é que torna todas as personagens redundantes. Não é evidente na melhor personagem (Imperador), mas todas as outras ficam impregnadas com um fedor a lixo intergaláctico: dispensáveis e destinadas a chocar umas com outras até eventualmente caírem na atmosfera quando servem o seu propósito. O enredo tenta compensar isso com recurso à memória genética que Salvor experiencia (ao ver a infância de Gaal e Raych), mas é mais um conceito sobrenatural/de ficção científica que o espectador é obrigado a aceitar.
Jared Harris é morto demasiado cedo, numa cena que não causa impacto devido ao inevitável regresso (seja em que formato for). Se inicialmente é uma personagem enigmática, um mestre de marionetas cujas intenções reais podem moldar o destino de todos, no final sobra apenas um Obi-Wan Kenobi decidido a trolar tudo e todos com meias respostas. Gaal (Lou Llobell, excelente na sua estreia), limita-se a ser um urso no inverno, hibernando quase toda a temporada, saltitando entre tempo e espaço. Salvor Hardin (Leah Harvey), a verdadeira protagonista, percebe aquando nós que é apenas um peão num plano bem maior e é obrigada a encontrar o seu próprio caminho.
O problema maior da 1.ª temporada de Foundation é, no entanto, todo o enredo do jovem Imperador (Cassian Bilton), do seu amor Romeu e Julieta, e o fruto seco que sobra dele. É certo que teve consequências no projeto de clones, com o irmão Dusk a ser talvez o único sobrevivente não manipulado. Mas o jovem morre, a rapariga é presa e dá a profunda ideia que o arco não serviu para muito, dando apenas a sensação de que desperdiçaram o nosso tempo com um arcozinho juvenil. Considerando o salto temporal que vemos no final, com Salvor e Gaal, provavelmente nem veremos de que modo o irmão Day lidou com o facto de ser “impuro”…
Não vou tocar na disparidade entre a obra original e a série. Primeiro porque não conheço os livros de Asimov, segundo porque há coisas francamente diferentes que me pareceram benéficas (três imperadores em vez de um e a mudança de género de certas personagens) e terceiro, e o mais importante, isso não interessa para nada. A série até podia ser baseada numa frase dos pacotes de açúcar que lemos no café, o importante é que a história sobreviva por si e que a obra não seja muleta (*cof cof GOT cof cof*), nem desculpa.
O que sobra então no fim, para além do fantástico visual que a Apple pagou? Que conteúdo nos incentiva a acompanhar uma série que parece não se preocupar com as personagens como indivíduos? Não chego ao ponto de afirmar que Foundation é de beleza exterior e oca por dentro, porque há performances boas e (talvez) uma história que no fim possa valer a pena. Mas um corpo escultural com uma cara bonita entretém até ao ponto em que abre a boca, que é como quem diz, quando o fascínio inicial passa e somos confrontados com a realidade. Talvez o segredo para desfrutar em plenitude de Foundation seja não pensar muito no que estamos a ver, mas é mais um favor que a série pede ao espectador e nem toda a gente está para aí virada.
Receio que o ponto de saturação chegue bem antes do que os produtores desejam, bem antes do plano de 80 episódios para contar a epopeia. Esta sensação é agravada pelo facto de a série levar-se muito a sério na sua temática. Isto porque nem revela grande inteligência de argumento e facilmente se distrai com a primeira mosca que lhe passa à frente do nariz.
Acima de tudo, os produtores e argumentistas parecem ter-se esquecido que uma série de televisão é mais parecida com uma tour de bicicleta do que uma maratona de corrida: é necessário recompensar periodicamente o espectador com pequenas vitórias. No final temos uma camisola amarela vencedora, mas há vários vencedores de etapas entretanto. Uma série tem temporadas por algum motivo, e esta primeira falha em dar-nos motivos para acompanhar o resto da pedalada, exagerando nos momentos mortos, poucos picos de qualidade e a contar muito nos visuais para dar adrenalina à corrida. Uma paisagem nos Alpes Suíços e uns atletas de qualidade não justificam totalmente a nossa atenção.
Foundation é um tempo bem passado, mas não serve de boa “fundação” para a história que almeja contar. A série terá de mudar a sua abordagem, mas lamento que já vá tarde para uma grande parte do publico que deu uma hipótese.
Perguntas e idiotices:
Personagem de Destaque:
Zephyr Halima e Demerzel – Poderia alongar-me novamente na genialidade de Lee Pace, mas prefiro destacar antes estas duas mulheres, que demonstram o quanto a série avança graças ao poder feminino. Demerzel (Laura Birn) é uma mistura de reatividade robótica com psicologia humana, com função de ama, mordomo e catalisadora destes imperadores. O facto de ter uma religião e esta moldar o seu comportamento, assim como a reação no final, com o arrancar a própria cara após a execução, são dois pormenores que achei deliciosos. Já Zephyr (T’Nia Miller) é um bomba em forma de mulher. Os seus discursos e a maneira como serve de antagonista a Lee Pace marcaram o ponto alto da temporada para mim. Peca pela presença breve.
Melhor Episódio:
Episódio 8 – Missing Piece – Talvez o episódio mais humano da temporada. Temos Lee Pace em grande destaque na sua peregrinação e a ação na Invictus, mas acima de tudo temos a conversa entre Zephyr e Demerzel e a revelação que o Imperador Day não teve qualquer revelação no fim da sua caminhada, demonstrando que há algo de “errado” com ele…
Vítor Rodrigues