[Não contém spoilers]
Temporada: 3
Número de episódios: 8
No mês do orgulho LGBTQ+, haverá tema melhor do que o de uma série que aborda o percurso dos antecessores e a importância das suas conquistas que tornaram possível a celebração nos dias de hoje? A 3.ª temporada de Pose viu o seu primeiro e segundo episódios estrear a 3 de maio de 2021 na HBO Portugal, tendo os restantes estreado semanalmente ao longo do mês até ao dia 6 de junho. Esta é a temporada final da já conhecida série dramática que segue os nossos protagonistas numa fase mais tardia das suas vidas.
Os protagonistas representam não só a comunidade homossexual e transgénero, mas também a comunidade negra e latina, também muito sujeitas ao preconceito por parte da sociedade. Algo que traz mais realismo e faz com que a série se destaque em termos de representatividade é que em Pose há cinco elementos trans no elenco, Hailie Sahar, Indya Moore, Dominique Jackson, Angelica Ross e M.J. Rodriguez, que dão vida, respetivamente, Lulu, Angel, Elektra, Candy e Blanca. Só Dominique era já nascida na altura que a trama de Pose retrata ao início, mas o facto de serem parte da comunidade trans faz com que tenham muito mais presentes as dificuldades e discriminação do passado e que continuam a existir. Esta componente é muito importante para que a mensagem da série seja realmente transmitida de forma eficaz.
A 3.ª temporada dá continuidade à história decorrida nas anteriores, focando-se bastante no modo como as personagens lidam com as emoções. Como é de conhecimento geral, os anos 80 foram marcados pelo aparecimento do vírus do HIV, que depressa começou a ser associado à homossexualidade. Como não podia deixar de ser, vemos a doença retratada logo no início desta temporada. Assistimos ao caminho doloroso daqueles que têm esta triste sorte. Sofrem desde o momento do diagnóstico, passando pelo aparecimento das primeiras consequências visíveis, numa espera sufocante pela morte quase inevitável. Vemos também como cada uma das personagens tem formas diferentes de lidar com as mortes dos seus entes queridos: uns procuram maneiras de ajudar os que continuam vivos, outros deixam-se levar pelo desespero e usam o álcool e as drogas como escape a esta dor pela perda dos seus amigos e pelo medo de um dia poderem vir a ser eles a perder esta batalha.
É notória nesta série a forma como a morte nos faz olhar a vida de outra forma, querendo mostrar o nosso amor aos outros, perdoar e procurar perdão junto dos que nos são mais queridos. Outra temática desenvolvida nesta temporada é a quantidade de coisas de que as pessoas transgénero acabavam por se privar nesta época por medo da opressão e preconceito da sociedade, que os fazia acreditar que era impossível, como é o exemplo do casamento. Está bem presente o medo de não conseguir casar, tendo mudado de género, de tal forma que a maioria dos membros da comunidade nem tentava. É importante dar destaque ao apoio, união e entreajuda constante que existia dentro da comunidade e sem os quais não teria sido possível sobreviver. Assistia-se a um espírito de sacrifício, principalmente da parte das “mães” para que todos tivessem uma casa, comida e pudessem viver a sua verdadeira identidade.
Enquanto as outras temporadas se focaram mais em retratar o momento presente e a chegada dos membros mais recentes à comunidade dos balls, esta temporada centra-se nos membros mais antigos. Ao longo dos episódios, vamos visitando momentos do passado de algumas das personagens. É feito o uso de flashbacks de momentos anteriores à ação da 1.ª temporada da série, o que nos ajuda a entender a ação no tempo atual e funciona como forma de enriquecimento da história. Ficamos a conhecer o percurso das personagens até ao momento presente, a sua personalidade, bem como os mecanismos de defesa que foram adquirindo como instinto de sobrevivência. Se já não tínhamos uma boa perceção das caraterísticas das personagens, depois destes episódios finais ficamos a conhecê-los de uma forma bastante íntima. Os diálogos são longos e bastante elaborados com uma carga de drama que deixa o espectador colado ao ecrã. Cada episódio de Pose cumpre muito bem a tarefa de equilibrar a linha do cómico com o trágico, sendo que o trágico acaba sempre por ter mais peso.
Em termos de banda sonora, esta ilustra na perfeição a época da série e como sou fã de música dos anos 80, esta componente só veio tornar Pose ainda mais atrativa aos meus olhos. A imagem da série é bastante colorida no contexto dos balls, mas utiliza tons mais neutros nas restantes cenas. Denota-se uma iluminação amarelada alusiva aos filmes produzidos nos anos 80/90.
Se gostaste das duas primeiras temporadas de Pose, a terceira é um must watch, está muito bem conseguida e, como temporada final, dá uma boa conclusão aos vários acontecimentos, transmitindo mensagens poderosas ao espectador. Se acreditarmos que conseguimos fazer algo já é meio caminho andado para efetivamente o alcançarmos. No final da temporada há uma fala que resume muito bem aquilo que esta série representa: “As casas são lares para todos os que nunca tiveram um. E eles vão continuar a vir para cá, para Nova Iorque, tal como o sol vai nascer.” Pose é união, resiliência, espírito de sacrifício e se gostas de ver as pessoas a lutar por elas mesmas e pela sua felicidade então inspira-te! É sem dúvida uma temporada emocionante que provavelmente levará os mais sensíveis às lágrimas.
Melhor episódio:
Episódio 7 – Series Finale (Part I) – Escolhi este episódio porque me parece ser o culminar da temporada. Arrisco dizer que é o episódio em que mais vemos a resiliência e luta em momentos em que parece já não haver esperança. Por mais que estas pessoas lutem, continuam a ser discriminadas, mas vemos também o espírito de sacrifício dentro da comunidade.
Personagem de destaque:
Pray Tell (Billy Porter) – Esta personagem teve uma evolução incrível ao longo da temporada. Frustrado por ver os amigos partir, vítimas do vírus, é dos mais afetados psicologicamente. No entanto, à medida que os episódios avançam, ele vai ganhando força e vai encarando a vida de outra forma. Oriundo de uma família católica, nunca foi compreendido, ganhando uma revolta contra a igreja. É uma personagem resiliente, corajosa, generosa e amiga dos seus amigos.
Inês Rodrigues