Minissérie
Número de episódios: 8
[Contém spoilers]
Little Fires Everywhere é uma minissérie diferente daquilo que imaginava. Estava à espera de um bom drama (afinal a Hulu é a casa da absolutamente extraordinária The Handmaid’s Tale) e não de uma série repleta de segredos e manipulações. Não que isso seja impedimento para aquilo que constitui um bom drama, mas há que jogar com a dose certa.
A série começou muito bem, com um piloto extremamente cativante, e aguentou-se também muito bem durante mais algumas semanas, mas a partir do 5.º episódio começou a perder o fogo. Nem me façam falar no 6.º episódio, que foi apenas de flashbacks. Alguns necessários e relevantes, é certo, mas metade deles não nos faziam falta alguma, sobretudo numa temporada tão curtinha. No entanto, tenho já de confessar que a série se redimiu na perfeição, com um último episódio de arromba que trouxe momentos fortes e o desfecho de que Little Fires Everywhere precisava para ficar na memória.
Temos duas protagonistas, Elena Richardson (Reese Witherspoon) e Mia Warren (Kerry Washington), completamente distintas. São as duas mães e os seus filhos tornam-se próximos. Mais do que a proximidade entre os miúdos, estabelece-se também uma ligação entre Pearl – a filha de Mia – e Elena e outra entre Izzie – a filha mais nova de Elena – e Mia. Não vou dizer que é propriamente isto que faz com que tudo descarrile, porque há muita coisa a correr mal por todos os lados, mas é um catalisador. Conhecem aquela expressão acerca da relva do vizinho ser sempre mais verde do que a nossa? É um pouco isso que se passa aqui: miúdas que se encantam com mães que não são as delas e mulheres que têm mais facilidade em lidar com as filhas dos outros.
A série vive então muito das relações familiares e da noção daquilo que é ser-se ou não perfeito, das expectativas (tantas vezes injustas) que os pais colocam nos filhos, não lhes permitindo que sejam quem são, numa tentativa de os moldar àquilo que desejam para eles. Little Fires Everywhere também se esforça por debater a questão da diferença de classes e das dificuldades que aqueles que menos possuem enfrentam num mundo que tem tendência a favorecer aqueles que, de facto, mais têm. O problema é que a série nem sempre é certeira na forma como trata estes temas. Ninguém é mau porque é rico nem ninguém é bom porque é pobre ou vice-versa. Ninguém é feliz só porque tem uma boa casa, cheia de mobília bonita e decorações de Natal perfeitas, e ninguém é infeliz só porque tem poucos bens materiais. Porque, se formos a ver bem, qual das famílias é mais equilibrada? Qual delas é mais feliz, no final de contas? Em qual delas é que o amor está presente sob a forma mais pura? Comecei a série sem sentir qualquer simpatia por Mia. Elena parecia-me uma versão mais chique e pirosa da Madeline – que eu adoro – de Big Little Lies, mas ao fim de oito episódios a minha opinião inverteu-se. Nenhuma destas mulheres é perfeita, ambas cometeram erros que puseram em causa a sua relação com os filhos, mas há pessoas que se sabem redimir e outras que certamente não conseguem. Não naquilo que realmente importa, pelo menos.
Uma das melhores partes da série foi, para mim, o julgamento que viria a decidir quem ficaria com a pequena Mirabelle/May Ling. Para mim a resposta era óbvia, mas nem por isso me senti sempre confortável com ela. Lamento que Bebe tivesse uma vida tão miserável que a levou a abandonar a bebé. Ninguém devia ter de passar por isso. Não duvido que amasse a filha e que pensasse que estava a fazer o melhor para ela quando a abandonou. No entanto, acho que faz diferença a forma como ela o fez. A bebé podia ter morrido antes que alguém a encontrasse! Ela não a deixou em segurança, esperou que as coisas corressem pelo melhor. Ainda assim, isso não me parece a parte mais determinante desta questão. Temos aqui em causa uma bebé de um ano. A menina não tem recordações da mãe biológica, Linda e Mark são os únicos pais que conhece. Pais que a amam também, sem qualquer espécie de dúvida. A menina chamou ‘mama’ a Linda porque é isso que é, a mamã dela. Esta questão não se teria colocado se a bebé já tivesse sido oficialmente adotada pelos McCullough, mas esse pormenor fez toda a diferença. Acredito seriamente que o superior interesse da criança está mais bem servido a favor dos pais adotivos. Não porque Bebe é pobre e os McCullough têm dinheiro, nada disso, mas porque Mirabelle criou laços com eles. A biologia importa, não vamos negá-lo, mas não tem que ser a coisa mais importante. Não é mesmo, aliás. Izzie faria tudo para que Elena não fosse a mãe dela.
Little Fires Everywhere é uma boa minissérie, com uma boa história, personagens interessantes e relações entre elas ainda melhores. Não vou dizer que é uma das melhores séries dos últimos tempos, porque não é, mas vale a pena ver. Se forem como eu, vão pensar nos episódios e no que neles se passou durante muito depois de terem acabado de os ver. Foi uma série que não conseguiu, em momento algum, deixar-me indiferente. Experimentei várias emoções ao longo destes oito episódios, mas considero isso uma coisa boa. Não prometo que se sintam sempre surpreendidos, há algumas coisas expectáveis, mas outras conseguirão, certamente, fazer-vos pensar: não estava à espera disto. A sério, desfrutem!
Apesar de ser minissérie, não ponho de parte a hipótese de Little Fires Everywhere ser renovada. Acho que a história tem tudo para terminar aqui, mas também pode ter potencial para mais. Sinceramente preferia que se ficasse por aqui, mas se surgir a renovação, podem crer que vou querer ver!
Melhor Episódio:
Episódio 8 – Pensei que escolheria o primeiro episódio, aquele que me fez ter expectativas extremamente elevadas em relação à série. No entanto, depois deste final não posso escolher outro episódio que não este! Houve sempre coisas a acontecer, emoções fortes, lágrimas (no ecrã e minhas aqui, no sofá) e um desfecho absolutamente satisfatório. Não digo isto quando algo corre da maneira como eu queria, mas quando faz sentido para a história que está a ser contada. E este final fez sentido! Houve personagens a revelarem as suas verdadeiras caras e outras a fazerem aquilo que estava certo. Umas cometeram erros sem que isso faça delas más pessoas, mas os de outras não são perdoáveis. Este final teve tudo o que se pode pedir de um bom desfecho de série!
Personagem de destaque:
Elena Richardson (Reese Witherspoon) – Não estou certa de que haja muitas personagens mais frustrantes do que Elena. Ao início ela parecia uma boa pessoa, a sério que sim. Talvez um bocado inconsciente na sua falta de noção, mas inofensiva. Revelou-se uma mulher extremamente manipuladora que dá cabo da vida dos outros a seu bel-prazer e que tenta dar lições a terceiros em vez de olhar para o seu próprio umbigo e para dentro da sua própria casa. Esta é uma mulher que disse à filha de 14 anos que era muito difícil ser mãe dela – e não o disse numa conversa franca, mas de forma frustrada, certamente incendiada pelos ciúmes da relação que a filha tinha com Mia – e, pior, esfregou-lhe na cara que não a queria. Uma mulher que se julga uma boa mãe não pode dizer à filha as coisas que Elena diz. Elena não soube ser a pessoa adulta nesta situação e agir em conformidade com isso. Elena nunca soube aceitar Izzie como ela é, portanto como é que Izzie iria aceitar a mãe? Até os outros filhos, aqueles que Elena considera quase perfeitos, ficaram chocados com a atitude dela. Elena é uma das personagens principais, mas acaba por destacar-se pela negativa. Se tivesse que escolher a personagem de que mais gostei não seria certamente ela. No entanto, penso que é mais do que justo nomeá-la como a de maior destaque pela sua relevância em toda a série.
Gostaste de Little Fires Everywhere ou achaste que a minissérie ficou aquém das expectativas?
Diana Sampaio