La Casa de Papel – Review da 4.ª Temporada
| 15 Abr, 2020

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Temporada: 4

Número de episódios: 8

[Contém spoilers]

Chikipum, chikipum, chikipum.

Depois de uma 3.ª temporada que pareceu não corresponder exatamente às expectativas, La Casa de Papel regressa aos pequenos ecrãs com uma 4.ª de tirar o fôlego. Literalmente! Se nos oito episódios anteriores já se tinha sentido uma maior aceleração da narrativa e muitos mais momentos de ação, nestes a escala esteve prestes a rebentar, assim como os corações dos espectadores. A adrenalina e a emoção foram tantas que o ataque cardíaco esteve iminente. Pelo menos no meu caso.

La Casa de Papel tornou-se num fenómeno incontornável da cultura pop, tal como o comprova o documentário feito sobre a série. Quem não viu, aconselho que veja. Está muito interessante e revela o behind the scenes de algumas cenas e ainda aborda todo o movimento que se criou por esse mundo fora ao redor dos fatos de macaco vermelhos e das máscaras de Dalí. Gostava de ter visto o making of de mais momentos-chave da série, mas não se pode ter tudo.

Esta 4.ª temporada/parte (não entendo mesmo estas divisões da Netflix) começa exatamente onde a 3.ª nos deixou. Desde o primeiro minuto do primeiro episódio até ao último instante da season finale que a sensação de inquietação, nervosismo, receio e choque não me deixaram. Todas essas emoções estiveram sempre comigo durante as cerca de seis horas que me levou a maratonar os oito episódios. Foi sem dúvida a temporada que mais sentimentos negativos e de sobressalto provocou em mim. As outras também os tiveram, mas não de uma forma tão demarcada. E esse foi, muito provavelmente, o fator que fez elevar a 4.ª temporada a outro patamar.

As duas primeiras temporadas, correspondentes ao primeiro assalto, equivaleram a cerca de cinco dias na Casa da Moeda, sendo que todos os envolvidos tiveram cinco meses para se preparem ao milésimo de segundo para o que se seguia. A narrativa desenvolveu-se de forma muito mais lenta, dando espaço a mais cenas de silêncio e a diálogos mais demorados. Na terceiras e quarta, tal como já se tinha verificado, os eventos precipitaram-se e, no total, o bando passa cerca de dois dias e meio no Banco de Espanha. Antes disso, decorreram 17 dias entre Rio ser levado e todos estarem reunidos para pôr o plano em prática e mais quase mês e meio para entrarem em ação. Portanto, à partida, esta já seria uma causa para que nem tudo corresse bem. Contudo, há que ter outro fator em conta: a ligação emocional entre todos. Isso sim foi o que os pôs verdadeiramente à prova no conjunto dos 16 episódios e foi também o que tornou toda a história muito mais interessante.

Se por um lado continuo a achar forçado o ponto de partida da 3.ª temporada (Rio ser capturado e todos se juntarem para o salvar, cometendo outro assalto), a incrível realização e o consequente argumento que daí originou faz-me pôr de lado essa incerteza. Especialmente nos mais recentes oito episódios, todas as equipas de produção por detrás do resultado final que vimos estão de parabéns. As explosões, os tiroteios, a construção dos episódios com a intercalação de cenas do futuro ou do passado para nos fazer crer que a história ia seguir determinado rumo quando na verdade não tinha nada a ver… Bem, devo dizer que mais do que uma vez fiquei de boca aberta com a genialidade do argumento.

A presença de Berlim em flashbacks

Os flashbacks com Berlim são uma delícia. Apesar de a personagem ser detestável no decorrer do primeiro assalto, o seu passado demonstra que há algo mais nele. Para quem não sabe, a série era para se ter ficado pelas duas primeiras temporadas/partes (na verdade era só uma temporada; a Netflix é que dividiu em duas), mas depois o streamer adquiriu o projeto e encomendou mais duas. Como tal, a história teve um fim, incluindo Berlim, cujo arco se concluiu ao sacrificar-se para que os restantes membros pudessem escapar. Porém, a perspetiva de novos episódios permitiu que o passado dos irmãos Andrés e Sergio fosse explorado e assim surgiram os flashbacks em Itália, assim como Tatiana.

A meu ver, se nos estão a mostrar cenas passadas de uma personagem que já não está no presente é porque significam algo importante. O que sabemos sobre Tatiana? Praticamente nada, apenas que é uma ladra de joias. Sabemos também que Berlim a queria incluir no assalto e que isso não aconteceu. Palermo acabou por também não ser parte integrante do primeiro assalto, mas esse sabemos porquê. Há teorias a circular de que Tatiana tem algo a ver com Alicia, a inspetora. Ambas têm cabelo ruivo e pode-se dizer que são parecidas. Para mim, se houver ligação, no máximo elas são irmãs. Irónico, não acham? Uma irmã agente da polícia e outra que rouba. Mas será tudo assim tão linear? Alicia é tudo menos alguém bonzinho.

La Casa de Papel não deixa pontas soltas e parece-me que na próxima temporada vamos descobrir mais sobre esta relação fogosa de Berlim. Mas bom, quem não ficou encantado com a interpretação de Ti Amo? A adição do coro de monges deu o toque que selou essa cena como umas das mais encantadoras da série. Quero mais Pedro Alonso a cantar, por favor!

A necessidade da presença de Arturito ou a falta dela

Arturito não é um fan favorite. Aliás, tornou-se mesmo no ódio de estimação dos fãs. Pelo menos o meu sei que é. Por muito irritante que esta personagem sempre tenha sido, o seu desenvolvimento atingiu um pico nesta temporada que eu não esperava e que para a maior parte dos espectadores pareceu um pouco rebuscado e sem sentido. Contudo, se formos analisar um pouco melhor as suas ações passadas conseguimos perceber que o abuso sexual cometido sobre Amanda não é assim tão exagerado.

Na 1.ª temporada, Arturo é introduzido como o Gerente da Casa da Moeda que tem um caso com a secretária, engravida-a e acusa-a de o filho não ser seu. Ainda nessa temporada, depois de Denver dar um tiro na perna a Mónica e de descobrirem que ela afinal não estava morta, quando Arturo a reencontra e a abraça e beija, ejacula sem haver qualquer demonstração do mesmo sentimentos por parte de Mónica. Na 3.ª temporada, também quando reencontra Mónica, agarra-a na casa de banho, ao que ela responde apontando-lhe uma arma. Como vemos, Arturo sempre demonstrou sinais de não ser o maior respeitador das mulheres, contrariamente àquilo que diz. Destes pequenos momentos ao abuso concreto vai um passo.

Ainda para mais, mesmo que não nos tenhamos apercebido, La Casa de Papel é uma série bastante inclusiva no que toca ao tema da sexualidade, introduzindo personagens homossexuais, bissexuais e agora transexuais com a revelação de Julia/Manila. Confesso que adorei este micro plot twist de haver um membro do bando infiltrado nos reféns e gostei ainda mais de toda a história por detrás disso. A cara de confusão de Denver é preciosa! Portanto, o assunto dos abusos sexuais vir à baila até me parece bastante natural e nada melhor do que Arturito para ser a cara nojenta desse tema. Se preferia que ele não fizesse parte da série? Sem dúvida! Mas já que faz, pelo menos que seja para algo tão importante hoje em dia.

O quadrado amoroso e os sentimentos repentinos

Já na 3.ª temporada tínhamos tido indícios de uma tentativa de disrupção dos dois casais do bando quando Rio termina a relação com Tóquio e esta se embebeda e beija Denver. Sempre houve uma certa química entre estes dois, mas agora Denver é um homem de família! Entendo que estar numa situação daquelas não seja fácil e que as emoções estão à flor da pele, mas toda a questão à volta dos ciúmes das duas personagens mais explosivas da série pareceu-me um pouco forçado. Em última instância, entendo as reações de cada um (Rio encontra em Mónica um ombro amigo; Mónica não reconhece a violência de Denver depois de dois anos a viveram no paraíso; Tóquio e Denver gostam demasiado dos respetivos parceiros para saberem lidar no imediato com a proximidade deles) e claro que estão dentro do contexto destas personagens, mas ainda assim senti um pouco de esforço neste subplot.

Ainda na questão amorosa tivemos a relação de Nairobi com Bogotá. Repito: eu entendo que seja uma situação extrema, mas fui só eu a achar que estes dois começarem a gostar um do outro foi demasiado repentino? Talvez sirva para colocar Bogotá num ponto de viragem com a morte de Nairobi, querendo vingá-la e tendo um fim igualmente triste. O plano em que vemos Bogotá na janela onde Nairobi levou o tiro no peito, com o buraco da bala na zona do seu coração, pode apenas querer dizer que está a sofrer por a mulher de quem gosta ter morrido ou pode querer dizer que o seu futuro não é o mais risonho.

Gandía: o assassino que transformou a temporada

Gandía já tinha aparecido na temporada passada, mas de forma pouco relevante. Sem dúvida que o destaque que teve e o papel que lhe foi dado transformou o rumo desta temporada. Foi o vilão em todos os aspetos da palavra, desde a sua aparência, às suas expressões, diálogos e ações. A par com Alicia, é uma personagem criada para que a odiemos. Apesar de o desprezar pelo que fez a Nairobi, só posso dar os parabéns aos argumentistas e ao ator, José Manuel Poga, porque realmente o resultado final é espetacular e sem este arco não haveria mote para a próxima temporada.

De ressalvar, contudo, que se não fosse Palermo nada disto teria acontecido. Gandía premiu o gatilho, mas Palermo é que despoletou toda a situação. Nunca gostei dele, parecia uma nova versão, ainda mais amargurada, de Berlim e ainda que Tóquio tenha feito um golpe de estado retirando-lhe a chefia, a verdade é que ele ia agir por conta própria colocando o plano em risco. No fundo, Palermo tem tanta culpa quanto Gandía e por isso nunca o vou perdoar. Tal como Berlim, espero que tenha o fim merecido.

A morte de Nairobi

A morte de Oslo, Moscovo e Berlim deixou claro que ninguém é intocável nesta série. Claro que parte de nós sempre pensou que não iriam aniquilar mais personagens acarinhadas pelo público, mas no fundo sabíamos que esse não era o caso. Ainda assim, a morte de Nairobi chocou-me imensamente. A minha reação foi de incredulidade pura. Só o que conseguia pensar era: “Mas espera. Ela levou um tiro no meio da testa. Não há cura para isso. Quer dizer que ela já não volta?”. Levou-me uns minutos a processar que a personagem más guay de La Casa de Papel estava morta. Foi um golpe duro, mas de certa forma entendo porque o fizeram. Do bando original temos Nairobi, Tóquio, Denver, Rio e Helsínquia; como novos membros temos Palermo, Estocolmo, Bogotá e Marselha. Destes últimos, se algum morresse, não iria originar uma reação como se fosse um dos originais a perecer (entre nós, se Helsínquia morresse também não ia haver grande alarido). Desta forma, para que se criasse o mote necessário à próxima temporada, alguém importante tinha que nos deixar.

Vamos por partes: como já disse, se Helsínquia fosse o escolhido, era triste, mas não era revoltante; Tóquio nunca poderia ser, pelo menos não agora. No fundo, foi ela quem catalisou este assalto e algo mais lhe está reservado antes do fim da série; Rio sofreu demasiado para morrer assim. Acho que o seu final terá de ser algo minimamente feliz; Denver estava entre as minhas suspeitas na temporada passada como um possível candidato a morrer devido a toda a sua conversa sobre querer proteger Mónica e como agora têm uma família. As minhas suspeitas não se verificaram, pelo menos por enquanto, mas se tivesse sido ele sem dúvida que a reação também teria sido de revolta; e como o destino de Denver provavelmente está marcado para a próxima temporada, resta Nairobi, a personagem com o sonho mais idílico de todos do bando. O que ela mais queria era ser uma mãe para o seu filho e ter outra criança para lhe poder dar a vida que não conseguiu dar a Axel. O seu futuro estava já delineado (Ibiza era um nome perfeito, não acham?) e tudo acabou num segundo.

A cena em que Helsínquia carrega o seu corpo e quando os seguranças do Governador saem do Banco com o caixão aos ombros foram das cenas que mais me tocaram emocionalmente. Também toda a sequência da porta e de Nairobi lá pregada como se fosse Jesus Cristo foram, para mim, dos pontos mais altos da temporada. Nairobi vai deixar saudades, mas também mal posso esperar por ver como irá o bando vingá-la.

E assim veio e foi mais uma temporada de arromba de uma das séries da atualidade. A realização e o argumento destes oito episódios foram incríveis e cumpriram o seu objetivo: deixar-nos colados ao ecrã durante horas e fazer-nos ansiar por mais quando chegou ao fim. O jogo está mais arriscado do que nunca e o mote para a próxima temporada promete ser tão ou mais nerve wrecking do que o desta. La Casa de Papel está de boa saúde e recomenda-se, mas com os rumores de uma 6.ª temporada só posso desejar que essa seja a última antes que se perca o tesouro televisivo que esta série é.

Personagem de Destaque:

Ágata “Nairobi” Jiménez (Alba Flores) – A personagem de destaque desta temporada nem podia ser outra. Nairobi sempre foi uma alma alegre nas cenas mais intensas e a sua personalidade sobressaía no meio das outras. Alba Flores fez um trabalho fantástico neste papel e só tenho pena de lhe dizer adeus. Mas pode ser que a vejamos em flashbacksFun Fact: sabiam que a última cena que a atriz gravou para a série foi precisamente a da sua morte? Torna tudo ainda mais sentimental.

Melhor Episódio:

Episódio 6 – KO Técnico – Como referi, a sequência da porta foi das minhas preferidas da temporada e, como tal, elejo o 6.º episódio como o melhor. O facto de Nairobi estar pregada a uma porta, com um buraco de uma bala na mão e ainda a recuperar de uma operação ao peito fez-me pensar que o pior já tinha passado. Que inocente que sou! O pior ainda estava para vir! O episódio está cheio de momentos de tensão; aliás, acho que todo o episódio foi um grande momento de tensão, com a explosão da granada no elevador e a atualização dos acontecimentos até descobrirmos o que se passou. Foi uma realização incrivelmente bem feita.

Beatriz Caetano

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