Quando a televisão tinha períodos, alturas específicas do ano para estreias e o único streaming que se fazia era nos rios, houve uma série que chocou Hollywood de tão cara que foi: Rome, da HBO.
Quando Roma deixou de ser uma república e se transformou no Império que todos conhecemos, quando figuras intemporais como Júlio César, Cleópatra e Marco António eram carne e osso, esta série centrou o seu enredo em dois soldados romanos. Todos conhecemos como viveram reis e rainhas, imperadores e gladiadores, mas como vivia o povo? Como era a vida de um comum cidadão ou comerciante nas ruas de Roma? Lucius Vorenus (Kevin McKidd) e Titus Pullo (Ray Stevenson) são dois soldados do grande exército romano, pessoas normais e sem importância que sobem na hierarquia militar por talento próprio, presenciando grandes momentos históricos. Todo o enredo gira à volta da relação entre eles e os seus afazeres militares e familiares, relegando para segundo plano os grandes nomes. Foge assim ao cliché de fazer mais uma série de época e contar aquilo que toda a gente sabe, mostrando antes quanto ganhava um soldado raso, como sustentava a família, como eram as ruas e os costumes, o que se comia, etc.
Com um orçamento milionário, muito dele gasto na construção de uma mini cidade romana, todo esse dinheiro sente-se nos episódios. Todas as casas e ruas que vemos foram mesmo construídas de propósito para a série, todas as indumentárias são as mais fidedignas possível e temos imensos planos exteriores. Rome foi, até Game of Thrones, a série mais cara da HBO, e contou com coprodução da BBC e da Rai italiana (filmada nos seus estúdios). As más notícias é que Rome não ardeu num dia, mas quase. Três mil metros quadrados (dos 400 mil) arderam após finalizadas as filmagens da 2.ª temporada (Nero não teve mão nisso). Ainda detém o recorde de maior estúdio exterior construído para uma série.
Não vos consigo dizer se o melhor da série são os cenários, os diálogos, as representações dos dois protagonistas ou dos secundários. Sobressai, na minha opinião, James Purofoy no papel de Marco António e a minha favorita, Polly Walker, no papel de Atia, mas depois temos absolutos “desconhecidos” como Ciáran Hinds, Lindsey Duncan, Tobias Menzies, Indira Varma e Ian McNeice.
Nada é censurado aqui. Há palavrões, sexo e sangue. Se um general passear por território romano e quiser ter relações sexuais com uma mera rapariga que por acaso passava ali a pastar as suas cabras, ele fá-lo! Num dos episódios, Atia manda o seu filho comer pénis de touro porque o acha pouco “rígido” e paga para o levarem às “meninas” para perder a virgindade. Ou seja, não nos tratam como idiotas e retratam a vida quotidiana sem filtros. Nas outras séries chegamos a pensar que os personagens não comem, não dormem nem vão à casa de banho. Aqui mostram-nos o dia a dia daquele mundo, de uma maneira cruamente satisfatória.
Não sei como recomendar mais esta série. Só lamento as suas duas pequenas temporadas de 12 e 10 episódios, respetivamente, mas talvez seja por isso que também é tão boa. Devido aos seus altos custos, a série não voltou para uma 3.ª temporada e terminou mesmo um pouco à “pressa”. Inicialmente estavam planeadas cinco temporadas e um filme foi prometido para dar um desfecho mais satisfatório, mas este nunca chegou. Pelo menos aqueles enormes primeiros 12 episódios nunca ninguém nos tirará!
Série muito nomeada e galardoada a não perder. Por favor, não vejas lixo, perde o teu tempo com algo genial! A série está disponível na HBO Portugal.
Vítor Rodrigues