A primeira grande estreia do ano da RTP é a adaptação de uma das obras literárias mais controversas da literatura portuguesa, O Crime do Padre Amaro, de Eça de Queiroz.
A história do romance passa-se em Leiria e começa com a chegada de um novo pároco à cidade, Amaro (José Condessa), que se instala na mesma casa de Amélia (Bárbara Branco). São dois jovens que rapidamente se apaixonam um pelo outro.
De acordo com realizador, Leonel Vieira, a série baseada no romance de 1875 é uma versão mais moderna dos acontecimentos retratados na obra literária, mantendo o seu sentido crítico à Igreja e um retrato da sociedade da época.
Filmada inteiramente em Leiria, durante dois meses, a série tenta ser o mais fiel possível ao livro e conta a história nos mesmos lugares. Seja na natureza ou dentro de casa, a caracterização dos cenários, assim como a das personagens, é um dos pontos a destacar por ter conseguido traduzir o ambiente da época para o ecrã.
O episódio cumpre o seu propósito de apresentar a história e as personagens ao público, levando o seu tempo a fazê-lo, principalmente no início, começando a avançar um pouco na história já mais para o final dos cerca de 45 minutos, terminando com uma cena que deixa entrever o que podemos esperar da relação de Amélia com Amaro.
Contudo, são as atrizes e os atores que mais contribuem para o sucesso deste primeiro episódio, com principal destaque para os protagonistas da história, que conseguem, com primor, passar o ar recatado e composto que as personagens pedem ao mesmo tempo que vão mostrando o desejo que sentem um pelo outro através do olhar. Com, pelo menos, uma personagem homossexual na narrativa, seria importante que mais atrizes e atores abertamente queer tivessem a oportunidade de fazer castings para estes (e outros) papéis, contribuindo também assim a televisão portuguesa para espelhar no pequeno ecrã a diversidade sexual existente no nosso país, ajudando a normalizar o que ainda não é considerado norma.
Sendo transmitida às 22h30 por conter cenas “mais ousadas”, segundo conta o diretor de programas da RTP, José Fragoso, na apresentação da série no passado dia 5 de janeiro, em Lisboa, este primeiro episódio de O Crime do Padre Amaro começa também já a desvendar o véu da ousadia que se poderá esperar nos episódios seguintes, com um cónego e um padre a quebrar o seu voto de castidade e uma jovem a masturbar-se.
Resumindo, O Crime do Padre Amaro é mais um exemplo de uma produção de qualidade da RTP, com um elenco admirável, mas continua a seguir a “receita” de muitas outras produções portuguesas que se baseiam em factos históricos. Neste caso em concreto, a série não é, realmente, baseada em nenhum acontecimento do passado, mas sim num livro. Só que este livro, apesar de ser ficção, pretende também ele ser um retrato da sociedade do séc. XIX, o que faz com que possa ser considerado um documento histórico e a abordagem do mesmo não parece trazer nenhuma originalidade ao género. Posto isto, deixo aqui uma pergunta, para refletirmos: não seria mais interessante explorar outro tipo de histórias com que o público, provavelmente, se identificasse mais?
Podes acompanhar a série todas as segundas-feiras, às 22h30, na RTP1 e, em antestreia, a partir das 12h, na RTP Play.
Imagem de Pedro Pina (RTP)