A televisão tem um problema grave. Este problema grave é a adaptação de grandes franchises (ou clássicos, neste caso) para o formato de série. Isto nem sempre resulta. Não resulta porque o que já é bom não tem forma de se tornar ainda melhor, muito porque, no panorama geral, esticar uma história que já conhecemos só força ao seu cansaço automaticamente. Depois de um horrível remake televisivo de Rush Hour, uma medíocre tentativa de trazer Lethal Weapon ou até mesmo o deplorável regresso do MacGyver, as cadeias televisivas ignoram a qualidade dos seus produtos em prole daquilo que se sabe ser um “íman de audiências”.
No meio deste número exagerado de remakes do cinema para TV, um que não iria passar despercebido seria precisamente o de The Exorcist, filme de culto de 1973 que se tornou uma das mais conceituadas obras do terror cinematográfico a nível internacional. Esta adaptação televisiva, ainda que não se aproxime (nem perto) dos calcanhares do grande filme, não o destrói também. Não destrói porque não se trata de um remake, mas sim de uma reinvenção criativa do livro de William Peter Blatty.
Conheçam Tomas Ortega, um padre charmoso e ainda na flor da idade, que começa a ser atormentado por pesadelos. Pesadelos estes que remontam para uma situação real. Esta situação leva-nos a uma favela do México onde um pequeno rapaz está possuído por um demónio e, para resolver o caso, está o Padre Marcus. Ainda que ignorando os pesadelos, Tomas presta auxílio a uma família que diz que uma das suas filhas está a ser vítima de uma presença sobrenatural, mas para solucionar este problema, o jovem do clero precisa de encontrar o Padre Marcus para obter respostas dos dois eventos.
Realizado por Rupert Wyatt (um realizador competente e responsável por Rise of the Planet of the Apes), The Exorcist acaba por se tornar um produto criativo, onde os planos, a atmosfera e os atores – que conseguem manobrar as suas personagens sem terem a preocupação de serem julgados pelo peso do suposto “remake” que carregam às costas – se unem em harmonia. De facto, o único problema aqui é ter ficado com o mesmo nome porque este exorcista não está sequer perto do clássico a nível narrativo. E ainda bem! A fluência dos eventos ganha um carisma ainda maior quando as sequências incomodativas e alegóricas à temática religiosa se tornam gráficas e dramaticamente pesadas.
O protagonista Alfonso Herrera (que não é um desconhecido para os fãs de Sense8) também é uma escolha bastante interessante, ainda que peculiar. O que seria inicialmente previsto é que o jovem ator iria servir de bode expiatório para “consolar as vistas” da maioria feminina, mas não é isso que acontece. E, ainda que esta ideia não seja totalmente errada, o facto é que ter sangue jovem no elenco força a narrativa a ficar ainda interessante ao público mais novo porque, sejamos sinceros, são uma das (poucas) maiorias que acompanham séries televisivas. A banda sonora é também ela homenageadora do grande clássico e o twist final revela-se bastante surpreendente.
Mesmo não sendo uma maravilha, The Exorcist lança-se por caminhos difíceis, mas não deixa de ser uma obra televisiva de qualidade e que promete tornar-se ainda mais cativante com o avançar dos episódios. Mesmo que estejam céticos em relação a isto, deem uma oportunidade e tirem conclusões por vocês mesmos.
Jorge Lestre