Little Fires Everywhere – 01×01 – The Spark
| 19 Mar, 2020

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[Não contém spoilers]

Reese Witherspoon e Kerry Washington apresentam-nos ao dia a dia suburbano de duas famílias muito díspares que encontram nos filhos algo em comum nesta adaptação da obra homónima de Celeste Ng. 

Depois de Big Little Lies, Little Fires Everywhere parece ser a grande nova aposta de Reese Witherspoon em mais do que um aspeto. Mais do que uma mera referência, Big Little Lies serve de ponto de comparação tanto para a performance de Witherspoon, como para a própria personagem; até o formato em que nos é contada a história (começando num momento trágico e envolvido num certo mistério e voltando depois atrás para um flashback dos eventos que levaram a esse momento) remete para este projeto anterior. No entanto, mais do que reforçar a clara aptidão de Witherspoon para interpretar o papel da mãe e dona de casa perfeita e controladora (uma descrição um pouco redutora de ambas as personagens em questão, mas lá chegaremos) esta série é também exemplo da qualidade da performance de uma atriz que parece ter ganho um novo impulso numa carreira já de si bem-sucedida. 

Em oposição à personagem de Kerry Washington, mas em completa sintonia com a sua performance, Witherspoon cria uma personagem que parece encolher e expandir nas alturas certas, surpreendendo-nos a cada momento como se cada nova informação fosse inesperada. Esta é, sem dúvida, o grande ponto forte desta série. Não tanto o enredo, que também é aliciante mas que esmorece comparado às personagens que se desdobram a cada momento cultivando cada vez mais interesse, simpatia, emoção… Estas personagens que parecem cada vez mais humanas, e muitas vezes evidenciam aquilo que ignoramos até uns nos outros. Estas personagens, que se tornam mais profundas, mais reais que a realidade, são o grande ponto forte desta série. Aquilo que se torna verdadeiramente impressionante neste caso é que o desenvolvimento destas personagens é quase inteiramente inesperado de uma maneira que faz absoluto sentido mas que consegue ainda assim fugir ao estereótipo. A capacidade destas personagens de nos surpreenderem quando achamos que já as compreendemos, que já as conseguimos encaixar num “tipo”, é o verdadeiro forte desta série.

Na verdade, ao contrário do que acontece normalmente, são as personagens que alimentam esta série e que a fazem valer a pena. Os eventos delineados pelo enredo são quase secundários porque o que é verdadeiramente hipnotizante é a maneira como estas personagens se moldam às circunstâncias, como influenciam o mundo à sua volta, como interagem entre si, e como são elas próprias que alimentam todo o enredo. Mais do que sentirmos que as coisas acontecem às personagens, sentimo-las a fazer as coisas acontecer, sentido-las envolvidas na ação, o que torna tudo tanto mais imprevisível como mais credível. Este elemento, combinado com as ótimas prestações dos atores, transforma aquilo que poderia ser uma série relativamente banal em algo envolvente, frustrante, comovedor e, acima de tudo, humano. Uma série fantástica e muito prometedora que é mesmo o ideal para quem procura uma recomendação para esta quarentena. Os três primeiros episódios já estão disponíveis.

Raquel David

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