(Contém spoilers)
Como diz o provérbio, “depois da tempestade, vem a bonança”. Esta 4.ª temporada de Black Mirror parece ter levado esse ditado à letra e, depois da tempestade que foi o 3.º episódio, Crocodile, eis que Hang The DJ surge quase como a bonança neste contexto.
Este quarto episódio, escrito por Charlie Brooker e realizado pelo conceituado Tim Van Patten (já esteve ligado a séries como The Sopranos, Game of Thrones ou Sex and the City), apresenta-se como um dos mais sentimentais de sempre desta série, tendo um final feliz – pelo menos se tivermos em conta o padrão de Black Mirror.
Frank (Joe Cole – Peaky Blinders, Skins, Green Rome) e Amy (Georgina Campbell – One Night, Murdered by my Boyfriend) são novos utilizadores do System, um programa idealizado para juntar duas pessoas que formam um casal perfeito num jantar. O programa, que diz ter uma taxa de assertividade de 99,8%, coloca os utilizadores em vários relacionamentos, cada um com um prazo de validade previamente definido, até que consiga encontrar o seu parceiro ideal com base no perfil desenhado pelo histórico dos relacionamentos anteriores. Os membros deste programa encontram-se numa cidade rodeada por uma muralha e sabem que se não cumprirem com as indicações que lhes são dadas podem ser expulsos para sempre.
A relação de Amy e Frank tem uma data de validade de 12 horas. Ambos sentem uma rápida conexão e sentem-se desiludidos por se separarem de forma tão precoce. Rapidamente o sistema os coloca em novas relações com outras pessoas – Amy fica ligada a Lenny por nove meses, enquanto Frank vê o sistema definir-lhe uma relação de um ano com Nicola.
Apesar de ambas as relações correrem mal, e de nenhum dos dois esquecer o seu primeiro encontro de 12 horas, Amy e Frank veem-se obrigados a confiar no sistema, que lhes indica que os momentos maus também são importantes para definir o perfil da sua futura alma gémea.
Depois de expirar o prazo da relação de Amy e Lenny, Amy vê serem-lhe atribuídos diversos relacionamentos de curta duração. Mas quando o relacionamento de Frank com Nicola termina, ele e Amy recebem uma nova oportunidade. Ambos prometem não olhar para o prazo de validade, mas, algum tempo depois, Frank começa a sentir a pressão de saber que algum dia o relacionamento irá terminar e acaba por ceder à tentação de ver o prazo de validade.
O contador apresenta cinco anos, mas, como castigo pelo incumprimento da promessa, o tempo começa a reduzir rapidamente, deixando o casal apenas com 20 horas. Quando Amy descobre, fica de rastos e ambos acabam desolados. Pouco tempo depois, Amy recebe o aviso de que o programa identificou o seu par perfeito, revelando que é alguém que Amy nunca conheceu. É-lhe dada a oportunidade de se despedir de alguém que conheceu ao longo do programa e Amy não hesita em escolher Frank.
O casal volta a encontrar-se no mesmo restaurante onde havia sido o seu primeiro encontro e Amy explica que não se consegue lembrar de nada da sua vida antes de entrar no programa. Frank confirma que acontece o mesmo e ambos decidem escapar, apesar dos avisos de que seriam expulsos para sempre.
Os dois começam a escalar o muro que circundava a cidade em que viviam, quando tudo onde se encontravam começa a desaparecer. É neste momento que o espectador percebe que todo o episódio se tratava de uma simulação computacional. O programa revela que a simulação foi executada 1000 vezes e que Frank e Amy se ‘revoltaram’ contra o sistema em 998 (os tais 99,8% de probabilidade de serem almas gémeas). No plano seguinte, deparámo-nos com o mundo real, em que Amy e Frank se encontram num bar, olham para o telefone e veem que ambos têm uma correspondência de 99,8% na aplicação de namoro que utilizam. As simulações são, na verdade, um algoritmo dessa aplicação, baseada no perfil das pessoas, para encontrar as pessoas com um perfil correspondente. Os dois trocam olhares no bar e o episódio termina.
Como não podia deixar de ser, vemos neste episódio algumas críticas à sociedade e à forma como a tecnologia é utilizada nos dias que correm, nomeadamente no que se refere a aplicações utilizadas para encontros casuais, como são os casos do Tinder, Happn ou Badoo. Amy passa por diversas relações passageiras de forma consecutiva e acaba por se revelar cansada desse tipo de relação por não ver florescer qualquer tipo de sentimento e empatia com a outra pessoa.
Noutra fase do episódio, Amy acaba também por revelar a Frank uma teoria, ao questioná-lo se realmente tudo o que o sistema estava a fazer não seria desgastá-los, colocando-os num relacionamento atrás de outro, em que cada vez se sentem mais cansados e descontentes, até que um dia, quando o sistema lhes disser que encontrou o par ideal, se sentem tão vencidos e exaustos que simplesmente aceitam e acomodam-se. Algo que também pode ser encarado como uma crítica à sociedade actual.
Em jeito de resumo, Hang The DJ apresenta-se como um episódio diferente e mais leve do que é habitual em Black Mirror. Apesar disso, fruto de um argumento forte e complexo, mas ao mesmo tempo bastante fluído e das excelentes interpretações de Joe Cole e Georgina Campbell, revela-se como um dos melhores episódios desta temporada.
Diogo Reganha