Lost: Ninguém Morre Sozinho
| 01 Dez, 2021

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Lost, em português Perdidos, estreou há 17 anos nos nossos ecrãs e é, desde então, considerada uma das séries com mais impacto e influência na indústria atual da televisão. Esta review é uma viagem por memórias, personagens e histórias que mudaram o mundo. Lost alterou padrões, testou metodologias e, com isto, possibilitou que narrativas e personagens se tornassem mais únicas, dinâmicas e cativantes. Através da escolha detalhada de um elenco diversificado e através da criação de fóruns online que permitissem a conversa, discussão e teorização sobre a história, esta série desafiou todos os hábitos e tradições, juntou-lhes uma pitada de sobrenatural e deu origem a uma das histórias mais icónicas do século XXI. 

A faceta feminista de Lost é também uma das partes mais aclamadas da série, ressalvando o facto de, desde o início, esta série ter mostrado e defendido a força e independência das mulheres, com personagens como Kate Austen (Evangeline Lilly), Sun (Yunjin Kim) e Rose (L. Scott Caldwell). Até então, tudo isto era praticamente inexistente e o surgimento de fóruns e blogues online na mesma altura em que Lost estreou fez com que esta série se tornasse numa das pioneiras relativamente aos fandoms digitais, fan fiction e threads de conversas na internet.

Contudo, a verdade é que nem tudo pode sempre correr na perfeição e Lost também tem falhas. E atrevo-me a dizer, tem falhas que chegam a ser fatais. A quantidade de plot holes e acontecimentos que ficaram por explicar e concluir é incalculável. A falha principal, a meu ver, é a mais básica: afinal de contas, o que era a ilha? E por que razão é que foram escolhidas especificamente aquelas pessoas para proteger a ilha? As perguntas são muitas, mas as respostas? Essas divertimo-nos a procurar no Reddit e a teorizar, enquanto víamos vídeos com mais de três horas no YouTube.

Mas o que seria um drama destes, com elementos mágicos e sobrenaturais, realidades paralelas e déjà vus, sem romance? Pois é! Lost brindou os espectadores com alguns dos casais mais épicos e famosos do mundo da televisão, começando pelo mais querido de todos os fãs: Jin (Daniel Dae Kim) e Sun. Que final foi aquele? Épico, mas absolutamente devastador. O único casal que, desde o início da série, se manteve fiel a si mesmo, que, apesar de desavenças e obstáculos, manteve o sentimento, a esperança de que aquele amor iria ultrapassar tudo. Contraditoriamente, foi dos meus finais e mortes preferidas da série. Tudo faz sentido: começam juntos, acabam juntos. Na saúde e na doença, até que a morte os separe. Mas a ironia é mesmo essa: nem a morte os separou.

Em segundo lugar temos Rose e Bernard (Sam Anderson), que desde o início foram também um exemplo de perseverança, paixão e união. Mesmo quando tudo parecia estar contra eles, acreditaram que se iriam encontrar novamente. Para mim, este é um dos momentos mais memoráveis de toda a série. O alívio e a felicidade nas suas caras quando voltam a ver-se ao fim de meses separados por árvores e uma tragédia que quase os matou, é inesquecível.

Depois, temos  casais como Hurley (Jorge Garcia) e Libby (Cynthia Watros), Charlie (Dominic Monaghan) e Claire (Emilie de Ravin), e John (Terry O’Quinn) e Helen (Katey Sagal). Confesso que o momento em que, na 6.ª temporada, decidiram trazer Libby de volta para a série, me deixou ligeiramente surpreendida. Não estava nada à espera. Adorei que a fossem buscar novamente, porque a relação que tinha com Hurley sempre foi das minhas preferidas e, na minha opinião, uma das mais genuínas e descomplicadas. Charlie e Claire, por outro lado, proporcionaram-nos um dos momentos mais ternurentos de todas as temporadas: quando agarram na mão um do outro e se lembram, finalmente, de tudo o que passaram juntos, de cada momento e de cada emoção… Quanto a John e Helen, a verdade é que ainda tenho dificuldade em falar sobre o final de John, pelo que me limito a dizer que mereciam ambos muito mais do que aquilo que lhes foi dado.

Por fim, a maior disputa da história dos casais: o quadrado amoroso mais angustiante de todos os tempos. Jack (Matthew Fox) e Kate, Kate e Sawyer (Josh Holloway) ou Sawyer e Juliet (Elizabeth Mitchell)? Sinceramente, acho que todos têm pontos positivos e negativos. A verdade é que é uma das decisões mais complicadas que, enquanto fã da série, me obriguei a tomar: se pudesse escolher somente um, qual seria? E a resposta é esta: Sawyer e Kate. Mereciam mais. Mais tempo, mais atenção e mais cuidado. E sim, estou muito chateada com os realizadores e criadores da série por não terem permitido a estes dois um final digno e épico como só Lost lhes poderia proporcionar. Este é, para mim, um  dos casais fictícios mais épicos. Alguma vez assististe a maior e melhor slow burn, com a química que aqueles dois tinham? Aposto que a resposta é não. É uma pena terem deixado tanto potencial desperdiçar-se e acabarem a série a fingir que nada aconteceu entre eles, mas enfim. O que vale é que esta série é muito mais que isto!

Os plot holes é que são, a meu ver, demais. Primeiro, nunca fica explicado o que a ilha é, efetivamente, como já referi, nem porque é que se movimenta para diferentes sítios do planeta. Tudo o que esteja associado a isto fica por explicar: a ilha tem uma fonte de luz que preserva todo o mal, mas como é que faz isso? E, se deixar de o preservar, o que é que acontece? Por outro lado, diversas storylines de várias personagens ficaram por explicar: porque é que Hurley tinha estado internado numa clínica, e porque é que Libby também lá tinha estado internada? O que é que aconteceu a Walt (Malcolm David Kelley)? Será que aquele epílogo extra de 10 minutos que fizeram da série, em que Ben (Michael Emerson) vai atrás do jovem para lhe oferecer um trabalho, pretende mostrar que Walt viria a tornar-se no “próximo” protetor da ilha, sucedendo a Jacob (Mark Pellegrino) e, posteriormente, a Jack e Hurley? Isto são, claro, interpretações minhas, mas explicaria a ausência dele da última cena da série, quando todos se encontram por uma última vez. Toda a narrativa da Dharma Initiative, das portas misteriosas no meio da floresta e dos números que todos os fãs de Lost parecem saber de cor (4, 8, 15, 16, 23 e 42), fica por explicar. Lembras-te daqueles pacotes enormes de comida que, magicamente, eram deixados cair na ilha? Quem é que estava responsável por isso e por que razão é que continuavam a deixar lá comida para os membros da Dharma quando eles já estavam, infelizmente, todos mortos? As perguntas são muitas e as respostas são poucas, por isso limitamo-nos a focar-nos nas personagens, no desenvolvimento e história de cada uma.

O voo Oceanic 815 mudou a vida de todos os que passaram pela experiência única e cativante que é Lost. E mudou também, de forma drástica e inesperada, o mundo da televisão. O lema live together, die alone, desde o início defendido pelas personagens, provou ser apenas uma forma mais simples de lidar com a vida, com menos expectativas e com a ideia base de que cada um de nós só pode verdadeiramente contar consigo mesmo e mais ninguém. No entanto, o fim da série provou exatamente o contrário a todos, tanto aos fãs, como aos personagens: apesar de terem passado a vida convencidos de que acabariam sozinhss, acabaram por se reencontrar. Live together, die together, é o que eu retiro de toda esta aventura. Ninguém morre sozinho.

Em retrospetiva, acredito, como já disse, que Lost foi das séries mais inovadoras e que mais influenciam a indústria hoje em dia. A verdade é que a equipa por detrás desta série foi das primeiras a jogar a sério com as ideias de “perdidos numa ilha deserta”, “lugar único com propriedades mágicas e sobrenaturais” e representatividade e diversidade de personagens. Se Lost fosse feita nos dias de hoje, seria pouco provável que as pessoas acompanhassem tudo até ao fim, é verdade! No entanto, Lost definiu uma época, um estilo e o início mais impactante de que há memória: os grupos de fãs online, a interação entre eles e a influência que têm na escrita, rumo e aparecimento de diversos filmes, séries e histórias.

A série está disponível na plataforma Disney+.

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