A próxima série de que vou falar dispensa apresentações, mas sou obrigado a fazê-lo porque há gente que ainda não era nascida quando House M.D. estreou e hoje já sabe ler.
Hugh Laurie é um senhor de 61 anos atualmente, mas já foi o homem mais sexy do mundo. Nos anos 80 e 90 fez Blackadder com Rowan Atkinson, uma série fantástica de humor sobre um anti-herói e as suas aventuras em diferentes épocas da história e A Bit of Fry and Laurie, uma comédia de sketches com o amigo de longa data Stephen Fry. Entrou em Sense and Sensibility, mas foi enquanto rodava o filme Flight of the Phoenix na Namíbia, que Hugh fez a demo numa casa de banho e o produtor ficou tão convencido com o seu sotaque americano que não se apercebeu que, na verdade, ele era britânico… e estava encontrado o ator que daria vida a Gregory House.
Dizer que House é das personagens mais complexas da televisão é dizer pouco… Um médico brilhante, com a especialidade em Nefrologia (doenças do sistema urinário) e doenças infecciosas, responsável pelo departamento de diagnóstico do hospital Princeton-Plainsboro. O seu mau-humor, total desrespeito pelos colegas e pacientes, o uso de uma bengala, sarcasmos de aço, vicio em Vicodin (um forte comprimido para as dores) e com métodos de medicina muito alternativos são a sua imagem de marca. Neste procedural médico os episódios focam-se na sua tentativa, e da equipa que ele tanto tortura, em desvendar os mais bizarros casos, usando os estranhos métodos (arrombar umas fechaduras já não é estranho…) para chegar ao diagnóstico. Entre casos clínicos ficamos a conhecer a dependência deste herói pelos farmacêuticos, os problemas com a ex-mulher, as confidências ao melhor amigo Wilson, as “brigas” com a chefe Cuddy, etc…
Inicialmente a acompanhá-lo no elenco temos três jovens médicos que ele vai usar, abusar, levar ao limite, e muitas vezes ultrapassá-lo. Cameron (Jennifer Morrison) é o coraçãozinho da equipa, uma santa imunologista que só quer o bem dos pacientes. Da sua história sabe-se que casou com um doente terminal de cancro, que viria a falecer uns meses depois. É das poucas pessoas capaz de “segurar” House nos momentos mais teimosos. O neurologista Eric Forman (Omar Epps) é um convencido doutor que por vezes é a maior dor de cabeça do chefe, e noutras o seu maior aliado. Com um passado ligado a pequenos crimes (que House faz questão de lembrar periodicamente), chega mesmo a chefiar a equipa durante uns episódios. Dr. Robert Chase, um Cardiologista australiano que faz quase tudo o que House manda, é aquele que menos o questiona, mas, em simultâneo, é aquele que menos merece o seu respeito.
Além da sua equipa há ainda Wilson (Robert Sean Leonard, originalmente fez casting para o papel de House), responsável por manter House minimamente racional. Pode-se dizer ser o único que House realmente ouve, a voz da consciência que ele teima em silenciar. Os melhores momentos de humor são protagonizados por ambos (num dos episódios, Wilson “rapta” a guitarra de House e vai mandando fotos e bilhetes a ameaçar a “vida” da pobre coitada… genial!). Se Wilson é responsável pela “trela” moral de House, Cuddy (Lisa Edelstein) controla a parte legal dos seus procedimentos. Amigos de longa data, Cuddy é responsável pela vinda de House para o hospital, e apesar dos limites que lhe impõe, sabe que os seus métodos resultam e por vezes fecha os olhos à logística pelo bem dos pacientes.
Hugh Laurie conseguiu com a sua fantástica (e galardoada) interpretação, fazer-nos gostar de uma personagem longe de ser perfeita. A série foi um verdadeiro fenómeno de popularidade e conquistou o mundo. Ao contrário das tradicionais e boazinhas personagens que vemos noutras séries, House é um homem com muitos defeitos, que testa constantemente a amizade dos que o rodeiam.
Como aspeto negativo só vejo o facto de todos os episódios serem muito parecidos, como seria de esperar de um procedural médico. O início é a pessoa a ficar doente, depois House expõe os dados do paciente, a coisa alonga-se e ele no fim tem um flash mental e resolve o problema… e a coisa não varia muito! Uma fórmula que o tempo tratou de extinguir, mas que dominava os grandes êxitos da época. A verdade é que são os episódios mais “originais” que ficam na memória e considerados favoritos pelos fãs (recordo o episódio em que House dá uma aula e expõe três casos, o episódio em que ele está preso no aeroporto e outro em que resolve um caso em pleno voo…).
Em suma, Dr. House é um fruto do seu tempo, com tudo o que isso tem de bom e de mau. O que ficará para a história é uma representação sem falhas de Laurie, algumas decisões narrativas questionáveis que esfriaram certas temporadas e um final que me satisfez em pleno. Se já devoraram todos os episódios de Criminal Minds e Bones e procuram uma série semelhante, não há como falhar com House.
Podes ver os 176 episódios de House M.D. na Amazon Prime Video.
Vítor Rodrigues