[Não contém spoilers]
Do criador de 3%, Pedro Aguilera, surge Onisciente, a recente série brasileira de ficção científica da Netflix que retrata um mundo em que cada cidadão é monitorizado por um pequeno drone, quase impercetível, 24h por dia. Os drones encontram-se ligados a um computador, que não pode ser acedido por absolutamente ninguém, a fim de ser possível a salvaguarda da privacidade das pessoas. O computador faz uma análise à informação recolhida pelos drones e, quando ocorre algum tipo de delito, é emitido um alerta a identificar o culpado. Isto permite que a criminalidade seja quase nula nas cidades que implementam o sistema (designado “Onisciente”), uma vez que os criminosos sabem à partida que vão ser apanhados. Esta invenção parece excelente, até que Nina (Carla Salle) se depara com um assassinato que não é comunicado pelo sistema, o que a levará a tentar descobrir o que se passou.
A grande razão que me levou a querer ver Onisciente, mais do que a premissa, uma vez que esta era desconhecida para mim, foi o facto de ser uma série brasileira. Cada vez mais, as séries que não são de língua inglesa chamam-me à atenção, não só pelas diferentes narrativas apresentadas, mas também pela questão da cultura, que quer de forma direta, quer de forma indireta, acaba sempre por ser retratada, acrescentando inevitavelmente algo único à série. Mesmo naquelas em que a ideia apresentada nos dá a sensação de que já vimos aquilo em algum lado, acaba sempre por ter algo singular dada a questão da cultura.
No entanto, após visualizar o primeiro episódio e ficar assim a conhecer a premissa de Onisciente, a questão da cultura deixa de ser o principal motivo que me leva a querer continuar a ver a série, uma vez que a história acabou também por despertar a minha curiosidade, tornando-se esta igualmente um motivo para ver os restantes episódios (tanto é que acabei mesmo por ver os dois seguintes). Isto porque séries que abordem a maneira como as novas tecnologias podem ser usadas fascinam-me, ainda para mais quando nos apercebemos que as ideias apresentadas não são totalmente impossíveis de serem realizadas, tornando tudo um pouco mais assustador. Para além disso, estas tecnologias, apesar de à partida demonstrarem bastantes vantagens e parecerem algo com o qual sonhamos, acabam quase sempre a longo prazo por revelar desvantagens que muitas vezes suplantam as referidas vantagens.
Onisciente mostra muito bem isso, uma vez que, apesar do sistema parecer perfeito, visto que consegue prevenir a criminalidade (tornando dessa forma os locais mais seguros), sem que a privacidade das pessoas seja afetada, este não deu o alerta após a ocorrência de um assassinato, o que acaba por pôr em causa o próprio sistema. Além disso, mais do que descobrir o motivo do assassinato e o porquê de o sistema não ter comunicado o mesmo, a série lida com a questão da privacidade, da segurança e da liberdade. A privacidade é supostamente salvaguardada porque ninguém pode aceder às informações recolhidas pelos drones, nem mesmo se for para ver imagens de uma pessoa específica no dia em que foi assassinada, mas isto acaba por criar um conflito com a questão da segurança, pois para manter uma é posta em causa a outra. Relativamente à liberdade, esta encontra-se relacionada com a questão de que só algumas cidades é que adotaram o sistema, havendo portanto um contraste entre estas e as que não adotaram o sistema. Este contraste não se nota somente nas atitudes das pessoas, mas também através da própria cor das cenas, que dá para ver que é diferente – o que eu achei bastante engraçado.
Assim sendo, acho que a história apresenta bases suficientes para ser uma boa série, uma vez que não só trata um tema que por si só já é bastante interessante, mas alia-o a um mistério que desperta ainda mais a nossa curiosidade e nos leva a deixar a Netflix avançar os episódio sem pensar duas vezes. Para além disso, Onisciente fez-me lembrar ligeiramente Black Mirror, série que particularmente gosto muito, o que pode ter feito com que eu gostasse ainda mais da série e, por conseguinte, a quisesse ver até ao fim.
Cármen Silva