ONE LINER: Um grupo de ambiciosos estudantes de Direito e a sua brilhante professora de Defesa Criminal envolvem-se num homicídio que promete mudar o rumo das suas vidas.
No mesmo sítio, dois mundos divergem. Um é de euforia, excitação e celebração. Mas não é esse em nos focamos; esse é apenas um pano de fundo. À frente e ao centro, o mundo que temos é de nervosismo, medo e culpa.
Quatro pessoas, uma estatueta ensanguenta, a palavra “corpo”; torna-se óbvia a origem do terror na atmosfera. Discute-se a arma do crime, discute-se o mover o corpo ou não. Discute-se; não se concorda. Uma decisão rápida é urgente. Qualquer uma. Uma moeda é atirada ao ar, oscila o pêndulo do tempo e somos atirados para 3 meses antes. Fomos remetidos ao início do período letivo, à primeira aula que os nossos quatro personagens tiveram de Defesa Criminal, lecionada pela brilhante advogada de defesa Annalise Keating (Viola Davis, The Help). E ela tem um segundo nome para a sua disciplina: How To Get Away With Murderer.
E é assim que o piloto de How To Get Away With Murder inicia o malabarismo para o resto do episódio. Apresentar uma multitude de personagens, baloiçando-se entre a história principal da série e a história episódica é para a maioria manter demasiadas facas no ar. E a verdade é que How To Get Away With Murder não escapou completamente sem lacerações, mas a maioria perderia um braço. E ver as lâminas voar…foi eletrizante!
Voltemos aos quatro culpados. O episódio começa por se focar no Wes Gibbins (Alfred Enoch, Harry Potter) e daí para a frente mantém-se mais focado nele que nos restantes três. O ator Alfred Enoch não é de todo o mais cativante do grupo e, por isso, este pode ter sido o primeiro escape das facas em malabarismo. Vou dar-lhe o benefício da dúvida uma vez que, enquanto ele tem cara, por assim dizer, de anjinho, o que encaixa bem na personagem neste momento, já o adivinho capaz de se desenhar mais maquiavélicas. E sem dúvida que esse desenvolvimento de personagem seria algo interessante de se ver.
O que ficámos a saber do Wes neste episodio? Ele não foi aceite para a Universidade de Filadélfia de imediato, foi chamado da lista de espera. E está a viver num apartamento com aspetos bastante creepy. Marcas de unhas na parede, marcas de dentes na madeira da cama. Digno de filme de terror. Segundo a sua hostil e barulhenta vizinha, o inquilino anterior era também ele um estudante de Direito que fazia “sexo louco e barulhento” e que teve um colapso nervoso. Seriam aquelas as marcas do sexo louco? Ou do colapso nervoso? Será que o Wes terá também ele um colapso? É um aspeto apresentado agora que certamente servirá de combustível para a história de outro episódio. Da mesma forma, as notícias que iam aparecendo ao longo do episódio de uma estudante desaparecida, culminaram no aparecimento do seu corpo e caso será certamente investigado como no próximo. Notavelmente, se as caras de culpa da vizinha do Wes e do seu amigo forem indicação, eles sabem alguma coisa deste caso. Neste sentido, é mais lógico então que o episódio se tenha centrado no Wes, dado que ele cria uma ligação adicional a um caso, ao invés de How To Get Away With Murder aparecer com os casos episódicos meramente através da Keating porque é advogada de Defesa. Mas levanta também a questão se os próximos se continuarão a focar nele ou se eles se moverão de personagem em personagem. A segunda opção é definitivamente a melhor – como vários anos de Lost já o provaram.
Que a série se tenha introduzido nos seus diversos aspetos e conseguindo ainda abordar histórias para os próximos episódios é testemunho a uma escrita acima da média.
Ainda assim, a coesão do episódio passa invariavelmente pela magnífica performance de Viola Davis. Apesar de acompanharmos de próximo o Wes, é a professora Keating que faz mover a narrativa, nomeadamente através da competição que criou. A advogada está a trabalhar num caso e lança um desafio aos alunos para a ajudarem. O vencedor receberá uma estatueta da Justiça que lhe permitirá safar-se a um exame se o quiser. Para além desse vencedor, outros três que se mostrem capazes serão escolhidos para trabalhar com ela ao longo do ano. Os prémios são sem dúvida aliciantes. Mas esperem! Nós conhecemos aquela estatueta: é a arma do crime que apareceu no início do episódio! Quem receberá a prenda amaldiçoada?
O caso legal: a amante de um homem de negócios está acusada de lhe ter trocado um dos comprimidos por uma aspirina, a que ele é alérgico, tendo assim intenção de matar (apesar de não ter conseguido).
Numa primeira fase da competição, os alunos tiveram que apresentar uma forma de abordagem que fosse melhor que a da professora. É claro que ninguém conseguiu, mas os nossos quatro estiveram entre os que se destacaram. Até mesmo o Wes, que apesar de uma abordagem bastante inconvencional e que até provocou risinhos na aula, surpreendeu a experiente advogada com a sua flexibilidade mental.
Com grande parte da turma eliminada nesta primeira fase, a competição só ficou mais acérrima.
O episódio começa a saltar entre a resolução desse caso três meses antes e o transporte do corpo pelos quatro alunos. Foram apanhados por um polícia a sair com o corpo enrolado num tapete da casa da professora. Embora o polícia só o tenha visto como um tapete, era premente arranjar forma de se livrarem dele antes que ele descobrisse alguma coisa. E foi a Michaela Pratt (Aja Naomi King, Black Box), que até ali só se tinha queixado e lamentado, que ofereceu um desenvencilhar incrível, arrancando até a um dos personagens, Connor Walsh (Jack Falahee), um indignado: “Onde é que essa miúda esteve toda a noite?!”. Pegando nisto voltamos 3 meses atrás para a sua maior contribuição no julgamento. A secretária afirmava que tinha visto a amante da vítima com comprimidos amarelos, como a aspirina, no entanto a Pratt descobriu que a secretária era na verdade daltónica! Não podia fazer tal afirmação.
A Pratt foi aqui apresentada de duas formas bastante diferentes, e foi a primeira prova de que HTGAWM não está interessada em trabalhar com personagens estereotípicas, mas multidimensionais.
O Wes tenta ele também contribuir significativamente para o caso e vai a casa da professora apresentar a ideia de um recurso legal que descobriu. Mas não só essa opção não era afinal viável, como serviu apenas para ele apanhar a professora num momento tórrido com alguém que não era o seu marido.
Já o Connor Walsh contribuiu para o caso de forma muito significativa. Seduziu um dos empregados de informática da empresa para ele lhe arranjar e-mails que tornavam o sócio da vítima um potencial suspeito.
O Connor é então, em princípio, gay. Nem todas as séries têm um bom historial de tratar as suas personagens gay bem. Focam-se demasiado no estereótipo. Não se perceber que ele era gay até a cena de sexo é um ótimo atestado de competência a HTGAWM. De louvar também, foi a opção do momento de sexo que ocorreu ter acontecido depois dele ter os e-mails e não para os conseguir, não abnegando um dos personagens de escrúpulos, demasiado cedo.
A Laurel Castillo não contribuiu propriamente para a defesa da cliente, mas descobriu que afinal era provavelmente a culpada. Não só isso, a tentativa de assassinato tinha sido planeada com a esposa da vítima. Ela leva esta teoria ao assistente da advogada Keating, Frank (Charlie Weber) com quem estava a ter um caso. Ele não desmente. Ela fica um pouco perturbada com estarem a defender alguém culpado.
No final de contas é a própria advogada que resolve o seu caso, apesar de o fazer com métodos nada éticos. Ela obrigou o chefe de polícia a mentir em julgamento. Como? Parece que o amante com quem o Wes a apanhou é esse chefe de polícia e ele também é casado (a mulher tem cancro, só para tornar a situação pior). Ou ele mentia, ou eram ambos atirados aos leões, com a sua infidelidade revelada.
Quanto ao prémio, o Connor ganhou a estatueta. A Pratt pela sua contribuição foi escolhida para ser a segunda a trabalhar durante o ano com a advogada. A Castillo também, mas pela sua capacidade de investigação. Houve outro aluno ainda, Asher Millstone (Matt McGorry, Fargo) a receber essa honra, embora não o tenhamos visto a fazer muito mais que ser um idiota (- foi a primeira opção como a vítima do inicio do episódio). E acabaria por aqui, já que a Keating disse que escolhia apenas quatro, mas decidiu escolher ainda o Wes porque, segundo ela, foi um aluno que demonstrou potencial. Ele desconfiou que seria apenas pela situação inconveniente em que a apanhou, mas ela desmentiu veemente.
Por fim, vemos os quatro a queimar na floresta o corpo da sua vítima, cuja identidade nos é finalmente revelada: o marido da Annalise Keating!!! Mas identidade a qual eles esperam que se extinga com o fogo.
Eu ainda não vi muitos pilotos, pelo que não o posso afirmar, mas a qualidade é tamanha que me arrisco a dizer que tenho fé que How To Get Away WIth Murder apresentou o melhor piloto do mês.
Nota: 9.5/10
André F Dias