Quando soube que David Benioff e D.B. Weiss, os criadores de Game of Thrones, em conjunto com Alexander Woo, iriam produzir uma nova aposta chamada 3 Body Problem para a Netflix, despertou a natural curiosidade para qualquer fã da série. Lembro-me de ter lido algo sobre a história na altura, mas como a estreia ainda estava longe no horizonte, confesso que não dei muita importância. A coisa mudou de figura mais recentemente, quando finalmente se soube que a série ia estrear em 2024. Aí sim, voltei a mergulhar no assunto, desta vez com mais atenção, e fui averiguar a premissa do livro, que me cativou de imediato. Pareceu-me bem dentro do género do que costumo ler, o que me pôs a indagar porque é que não tinha prestado mais atenção naquela primeira pesquisa. O objetivo passou então a ser ler o livro antes da estreia, pois, na minha opinião, é sempre melhor ler e depois ver do que o inverso. Vicissitudes da vida, não consegui, então embarquei na jornada da série como uma folha quase em branco e que jornada que foi!
Passada num futuro próximo em que a tecnologia está mais avançada, mas não assim tanto, apenas o suficiente para parecer um pouco mais evoluído do que o agora, os primeiros episódios servem principalmente para nos dar a conhecer esse mundo. Um ritmo bastante rápido, muitas personagens, um jogo de realidade virtual misterioso, entregue às mentes mais brilhantes do mundo, que replica épocas conhecidas, mas oferece enigmas desconhecidos. É intrigante e ao mesmo tempo deslumbra. Não sabemos o que se passa ali, como se fossemos mais um personagem a ser sugado para aquele universo. Os visuais do mundo virtual são magníficos e, bom, o historiador que há em mim apreciou bastante serem cenários de época. A junção de história com física foi a cereja no topo do bolo destes episódios iniciais. Juntaram duas coisas que me fascinam, então não será novidade que me prendeu logo a atenção. Nem queria bem saber o que estava na verdade a acontecer, apenas desfrutar este mundo criado à minha medida.
No entanto, essas respostas vieram e até mais cedo do que estava à espera. Pensei que o mistério iria durar mais. Claro que isso depois levantou mais umas quantas questões e operou uma mudança significativa na série. Passámos bruscamente de um grande ritmo, cheio de aventura e dos mais variados mistérios, em que as personagens iam só a navegar na crista da onda sem saber bem onde tudo iria desaguar, algo leve e até divertido, para um ambiente lúgubre, com o peso das respostas a atingirem-nos como um tsunami. Esta reviravolta marca claramente uma divisão na 1.ª temporada de 3 Body Problem. Temos duas partes bem distintas, sendo esta segunda sobre o aprofundamento de personagens e como cada um lida com o que sabe, com o que não sabe e com o que preferia não saber. Foi arriscado, em termos narrativos, esta opção, pois normalmente costuma ser ao contrário, primeiro introdução de personagens, num ritmo mais lento, e depois sim vai em crescendo até à season finale. Esta escolha levou a que a conclusão fosse de algum modo anticlimática, mas não a achei necessariamente má. Como referi, não li o livro, portanto também não posso aferir quanto à semelhança que a série terá com o mesmo. No entanto, foi estranho e penso que a revelação foi dada cedo demais. Não se tinha perdido nada em terem seguido mais uns episódios com o enigma central. Embora toda esta nova realidade seja bastante interessante e acompanhar as implicações dela em cada um dos personagens seja importante, podiam ter prolongado o mistério mais um pouco.
No que diz respeito à atuação, de um modo geral está bem conseguida. Bons personagens, bons atores, têm oportunidade de brilhar principalmente na reta final, com mais sumo, e a maioria deles está à altura da tarefa. Contudo, onde a série brilha mesmo, apesar das grandes prestações e do muito bem escrito argumento, é na produção. Cenários fantásticos, tanto no mundo real como no inventado, e uma imagética que nos deixa completamente imersos, principalmente nas partes mais contemplativas, transporta-nos para aquele momento e não mais do que uma vez me levou a imaginar no que eu faria ou sentiria se tivesse no lugar deles e não há muitas séries que nos deixem assim. Pontos para eles.
A série vinha com grande promessa e eu estava com esperança que fosse mais como as primeiras temporadas de Game of Thrones do que as últimas, pela óbvia comparação que todos que acompanharam a série fizeram, mas não estava à espera do que de facto aconteceu. De algum modo, conseguiram manter o nível do argumento/diálogo tão bom como nos tinham habituado, e a grandeza dos cenários não destruiu essa essência, mas complementou-a. Recomendo a série que, mesmo com todas as falhas que tem, não deixa de ser entretenimento puro, assim como uma reflexão importante sobre o que significa ser humano. Fiz maratona de 3 Body Problem numa altura em que pouco tempo tenho tido para mergulhar assim em alguma coisa, portanto está mais que recomendado o visionamento desta 1.ª temporada, que já se encontra disponível na Netflix.
Melhor episódio:
Episódio 3 – Destroyer of Worlds – De todos os episódios, este foi o mais marcante, pelo simples motivo que é aquele que dá uma banho de realidade aos personagens. Não há mais jogos no sentido virtual da palavra, não há mais escape, foi atingido o ponto de não retorno.
Personagem de destaque:
Da Shi (Benedict Wong) – Entre tantas figuras, cada um com as suas vidas e personalidades complexas, escolhas duvidosas, o detetive Da Shi é sem dúvida a linha condutora no meio do caos. Tem uma grande humanidade nele e sendo muito mais do que mostra à superfície, corta na perfeição com a representação estereotipada deste tipo de personagens. É sem dúvida o “bom polícia” da história.